
Não gostamos de passar por experiências de rejeição. Como reagir quando aqueles a quem procuramos ajudar rejeitam nossa ajuda? Kyle Johnston, pastor e conselheiro bíblico na Jubilee Community Church na Cidade do Cabo, África do Sul, fez considerações bíblicas e relevantes para os conselheiros bíblicos, mas úteis para todos quantos têm oportunidade de dar conselhos baseados na Palavra de Deus e passam pela experiência de ver seus conselhos serem rejeitados.
O texto abaixo é parte do artigo The Heartache of Rejected Counsel, publicado pela Association of Certified Biblical Counselors [1]
A realidade da rejeição
Mesmo quando aconselhamos sabiamente, não há garantia de que o nosso conselho será ouvido. Isso é algo que vemos acontecer também nas páginas das Escrituras.
Em Ezequiel 3, Deus ordena que Ezequiel seja uma sentinela para o Seu povo (Ez 3.16-21). Deus dá uma tarefa a Ezequiel: “Você ouvirá a palavra da minha boca e lhes dará aviso da minha parte” (Ez 3.17). No entanto, Deus diz a Ezequiel que haverá pessoas que ignorarão a mensagem. De fato, em Ezequiel 33, quando a imagem da sentinela é novamente apresentada (Ez 33.1-9), Deus diz a Ezequiel que, embora muitos gostem de ouvir suas palavras, eles veem Ezequiel como alguém cujas palavras são agradáveis de ouvir, mas para depois ignorar: “Quanto a você, filho do homem, os filhos do seu povo falam de você junto às paredes e nas portas das casas, dizendo um ao outro, cada um ao seu irmão: ‘Venham, vamos ouvir a palavra que procede do SENHOR’. Eles vêm até você, como o povo costuma vir, assentam-se diante de você como meu povo e ouvem as suas palavras, mas não as põem em prática. Com a boca, professam muito amor, mas o coração deles só ambiciona lucro. Para eles você não passa de alguém que canta canções de amor, tem uma bela voz e é um bom músico, porque ouvem as suas palavras, mas não as põem em prática” (Ez 33.30-32). Aqueles que têm se involvido em aconselhar outros biblicamente conhecem, com certa frequência, a experiência de ter aconselhados que aparentemente gostam do que ouvem e, na verdade, rejeitam o conselho recebido.
A mágoa que segue uma rejeição
Quando aconselhamos biblicamente, apesar de estarmos cientes das possíveis dificuldades, ainda podemos sentir muita mágoa quando nosso conselho é rejeitado. Quero sugerir que existe uma mágoa piedosa e uma mágoa pecaminosa que podemos vivenciar como conselheiros.
A mágoa piedosa
A mágoa piedosa é a dor e a tristeza que sentimos quando aqueles de quem cuidamos rejeitam a Palavra de Deus e, como resultado, incorrem em sofrimento e dor. Ela é o inverso do que o apóstolo João diz quando escreve: “Não tenho maior alegria do que esta, a de ouvir que os meus filhos vivem de acordo com a verdade” (3Jo 4). Podemos dizer com razão que uma das coisas que nos traz grande tristeza é quando aqueles a quem procuramos ajudar rejeitam a verdade de Deus para seu próprio prejuízo. Essa tristeza é apropriada e ela é até uma prova de nosso amor por eles.
No entanto, o que fazemos com essa tristeza? Nós lamentamos. Oramos por essas pessoas e conversamos com Deus sobre a dor que estamos sentindo. Pode haver, é claro, outros passos que precisam ser dados, dependendo do caso e das implicações da rejeição da Palavra de Deus. O que quero enfatizar aqui é que lamentamos. Ao lamentarmos, aprofundamos nossa confiança em Deus. Por meio da experiência da oração, somos lembrados de que Deus é soberano sobre todas as coisas, que Ele está cumprindo Seus propósitos eternos e permanece conosco em tudo isso.
Um livro da Bíblia que considero pessoalmente útil nesses momentos é 2Timóteo. Em sua carta final, Paulo fala de Demas, que “amando este mundo, abandonou-me” (2Tm 4.10). Na verdade, ao fazer referência à sua primeira defesa no julgamento, Paulo diz: “todos me abandonaram” (2Tm 4.16). Paulo conhece bem a mágoa da rejeição quando aqueles em quem ele investiu sua vida se afastaram dele e, certamente no caso de Demas, também se afastam do Evangelho.
O que fez com que Paulo não desistisse de seu ministério? Como Paulo lidou com a mágoa? Quando todos o abandonaram, Paulo disse triunfante: “O Senhor esteve ao meu lado e me revestiu de forças” (2Tm 4.17).
No aconselhamento bíblico, parece-me que precisamos aprender a viver a experiência sobre a qual Paulo fala em 2Timóteo 4.17. Independentemente de nossos aconselhados acatarem ou rejeitarem nosso conselho, e ainda que abandonem a causa de Cristo como Demas fez, precisamos aprender a prosseguir fortalecidos pelo Senhor. Considere novamente o quão maravilhoso é esse versículo. Memorize-o ou cole na porta da sua geladeira. O Senhor estará ao seu lado e lhe dará forças.
A mágoa pecaminosa
Existe uma mágoa pecaminosa que podemos experimentar? Sim, creio que ela pode muito bem existir. Quando nosso conselho é rejeitado, podemos ter uma sensação de orgulho ferido ou podemos ser dominados por um sentimento de incompetência. Ou talvez fiquemos refletindo obsessivamente sobre as minúcias de cada encontro e conversa numa possível busca de onde erramos.
No entanto, embora nosso conselho possa ter sido rejeitado e possa ser apropriado refletir sabiamente sobre nossa competência, devemos lembrar que o ministério de aconselhamento bíblico não diz respeito a nós. Não se trata de recebermos respeito, adoração ou aplausos. Em vez disso, ao servir os outros com as verdades da Palavra de Deus, cooperamos para que eles tenham alegria no Senhor (2Co 1.24). Qualquer crescimento em qualquer aconselhado vem de Deus. Talvez tenhamos plantado ou regado, e devemos nos esforçar para fazê-lo o melhor possível, mas “nem o que planta é alguma coisa, nem o que rega, mas Deus, que dá o crescimento” (1Co 3.7).
Siga em frente!
O que devemos fazer, então, quando nosso conselho é rejeitado e vivenciamos um momento difícil no ministério de aconselhar? Paulo dá o seguinte conselho a Timóteo: “seja sóbrio em todas as coisas, suporte as aflições, faça o trabalho de um evangelista, cumpra plenamente o seu ministério” (2Tm 4.5). Em outras palavras, diante de mágoas e dificuldades, continue. Siga em frente!
Enquanto você faz isso, enquanto suporta mágoas e dificuldades, minha oração é que você saiba que o Senhor está ao seu lado e lhe dá forças.
[1] Kyle Johnston. The Heartache of Rejected Counsel. Disponível em https://biblicalcounseling.com/resource-library/articles/the-heartache-of-rejected-counsel/.