Vivenciando a fidelidade de Deus no transtorno obsessivo-compulsivo

Cody Newcome


No meu primeiro ano enquanto conselheira bíblica, o Senhor enviou várias pessoas que lutavam com o diagnóstico de Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) para que eu as acompanhasse. Eu me senti muito inadequada para a tarefa, mas Deus foi fiel em me capacitar, por meio de Sua Palavra, de maneira que pude ministrar àquelas aconselhadas.

Para cuidar melhor daquelas mulheres, foi necessário ver e entender o TOC através das lentes das Escrituras. Sabendo que todos os comportamentos vêm do que habita no coração (Pv 4.23), foi muito útil para mim compreender melhor as questões do coração, que normalmente alimentam o ciclo do TOC, e buscar na Palavra de Deus como lidar com essas causas raiz. As pessoas aflitas pelo TOC, que tive o privilégio de aconselhar, passavam realmente por grandes dificuldades e, pela graça de Deus, Sua Palavra falou ao sofrimento e transformou aquelas vidas por meio do verdadeiro conhecimento de Deus. As batalhas diárias — às vezes minuto a minuto — ensinaram a essas mulheres como confiar mais em Deus e depender dEle de maneira mais profunda. Através do tempo que passei com cada uma daquelas aconselhadas, aprendi muito sobre como Deus pode usar o TOC para Seus propósitos bons.

A história de Tracy
A mãe de Tracy me ligou em uma tarde de outono, desesperada para que eu me encontrasse com sua filha de 30 anos de idade. O problema principal era o medo avassalador que Tracy tinha de perder a salvação e ser condenada ao inferno. No ano anterior, Tracy havia passado pelo terror de estar à frente de uma sala de aulas durante um tiroteio escolar. Após esse acontecimento, ela passou a enfrentar um estresse intenso e muita dor em sua família com múltiplos abortos espontâneos e o casamento com um marido severo, controlador e infiel. Na primeira vez que me encontrei com Tracy, ela chorou e tremeu o tempo todo. Contou-me sobre as palavras de condenação que ouvia o dia inteiro e durante a noite, dizendo que ela iria para o inferno por ter cometido o pecado imperdoável. Tracy estava tão dominada por esses medos — e pela frequência e intensidade deles — que não dormia havia dias.

Pude perceber logo de início que Tracy lidava com sinais daquilo que comumente é chamado de TOC, e se manifesta em pensamentos intrusivos, extremos e ameaçadores. às vezses, estes pensamentos podem ser de de natureza espiritual e, então, chamados de escrupulosidade ou TOC religioso. Aqueles que sofrem com essa forma de TOC experimentam, frequentemente, obsessões que alimentam o medo de que pecaram, perderam a salvação ou estão indo para o inferno. Comum nessa luta é uma introspecção mórbida, que analisa intensamente a própria condição espiritual e acredita nas mentiras e acusações de Satanás, em vez de olhar para Cristo. Esse era o caso de Tracy, e à medida que as semanas passavam, seus pensamentos obsessivos também se intensificavam, chegando ao ponto de ela ouvir blasfêmias em sua mente dia e noite. Ela estava convencida de que iria para o inferno, e o medo de ficar separada de Deus e de sofrer Sua ira só aumentava.

Antes que pudéssemos avançar no aconselhamento, foi fundamental que Tracy conseguisse voltar a dormir. O primeiro passo, portanto, foi que ela procurasse um médico para ajudá-la nesse aspecto. Em seguida, começamos lentamente a ler as Escrituras, escolhendo cuidadosamente os textos, porque ela se tornava facilmente muito assustada ao ler certos versículos. Iniciamos com salmos específicos, para oferecer conforto, e com as promessas de Romanos 8.31-39, que garantem que nada pode nos separar do amor de Deus. Além disso, nos primeiros dias, Tracy se apegou a Romanos 8.1, que lhe prometia que não há condenação para os que estão em Cristo Jesus. Quando ela conseguiu dormir melhor, prosseguimosa nos encontrar, semana após semana durante um ano, cavando fundo para encontrar as questões do coração que alimentavam seus pensamentos obsessivos e medos.

O evangelho
No centro de todos os nossos encontros de aconselhamento estava uma melhor compreensão do evangelho. Ela precisava de ajuda para entender e aceitar melhor a graça de Deus e a salvação que vêm somente pela fé. Ela havia acreditado erroneamente que poderia fazer algo para perder ou ganhar a salvação, o que perpetuava seus pensamentos obsessivos. Com a leitura das Escrituras, ela cresceu em sua compreensão de que a salvação é obra de Deus. Estudamos juntas os capítulos 1 a 3 de Efésios, e ela foi encorajada a olhar menos para si mesma e mais para Cristo e o que Ele fez. Passamos tempo nas Escrituras para compreender melhor a justiça imputada (2Co 5.21) e como somos selados pelo Espírito Santo, tendo nossa salvação protegida por Deus até estarmos com Ele no céu (2Co 1.21, 22).

Quem é Deus?
Outra fonte de seus pensamentos temerosos era uma compreensão equivocada de quem Deus é. Tracy via Deus como um ser cheio de ira e pronto para puni-la e destruí-la. Passamos várias semanas estudando o caráter de Deus e formando uma imagem mais precisa de quem Ele é através da vida de Jesus. Ela precisava de ajuda para entender e aceitar Sua graça, misericórdia e amor, mesmo quando cometia erros.

As promessas de Deus
Lemos juntas versículos sobre as promessas de Deus no sofrimento de Tracy, e como Ele pretende usar seus sofrimentos para produzir frutos em sua vida. Deus promete caminhar com ela em sua dor e sofrimento e nunca a deixar nem a abandonar (Is 43.2; Dt 31.6).

Como ler a Bíblia
Tracy tinha o mau hábito de tirar versículos do contexto e interpretá-los com base em seus próprios medos. Ela começou a aprender como ler a Bíblia como um todo e equilibrar todos os atributos de Deus com a verdade. Ela precisava de ajuda para ler as advertências e exortações da Bíblia junto com as promessas de Sua graça e misericórdia.

Resistir aos impulsos compulsivos
Era importante que Tracy entendesse melhor o TOC e como o ciclo era perpetuado ao ceder ao desejo de praticar comportamentos compulsivos. Em um esforço para silenciar a ansiedade e o medo causados pelos pensamentos intrusivos, ela fazia compulsivamente coisas que acreditava serem necessárias para se proteger de uma perda da salvação e para enfrentar a ira de Deus. Isso incluía confessar pecados compulsivamente ou procurar garantias de salvação nas Escrituras várias vezes ao dia. Ela aprendeu, lenta e dolorosamente, a resistir ao desejo de realizar esses comportamentos compulsivos e, em vez disso, confiar na Palavra de Deus e no próprio Deus como sua proteção definitiva. Esse processo levou meses, e estabelecemos metas semanais para diminuir os comportamentos compulsivos. Tracy começou a trocar sua forma compulsiva e ritualística de ler a Bíblia, confessar e orar, por um momento devocional mais intencional de comunhão com o Senhor, lento e sincero. Com o tempo, isso se mostrou muito benéfico para enfraquecer a intensidade dos pensamentos obsessivos e o desejo de praticar os comportamentos compulsivos.

Confiar em Deus e abrir mão do controle
Percebemos que o principal fator por trás da angústia dos pensamentos obsessivos e dos comportamentos compulsivos de Tracy era seu desejo por segurança absoluta e controle. Ela queria ter certeza de que estava perdoada e iria para o céu usando seus próprios meios, em vez de crer na Palavra de Deus. Realizar devidamente suas práticas, engajar-se em rituais espirituais e depender de afirmações internas ou externas trazia um alívio momentâneo. No fundo, havia uma falta de confiança em Deus. Ela cresceu no desejo de não buscar controle e autossuficiência, mas de confiar em Deus quanto à Sua promessa de segurança eterna.

Conclusão
Por meio do cuidado fiel de Deus e Sua intervenção na vida de Tracy, ela está muito melhor hoje. Os pensamentos obsessivos e as compulsões diminuíram significativamente, e ela desfruta de maior paz e segurança. À medida que as pressões e o estresse da vida aumentam, também pode haver uma recorrência das lutas com o TOC. Nesses momentos, ela sabe que deve se apegar novamente àquilo que sabe ser verdade sobre o evangelho e as promessas de Deus. No geral, Tracy experimentou alívio do desespero esmagador e da falta de esperança em que se encontrava, e em vez disso, aprendeu que Deus é fiel para com ela e que somente Ele é digno de confiança.


Cody Newcome é conselheira certificada pela ACBC e atua no ministério de aconselhamento bíblico em sua igreja local em Littleton, Colorado.


Original: God’s Faithfulness Experienced In Obsessive Compulsive Disorder
Artigo publicado originalmente em Association of Certified Biblical Counselors
Tradução e adaptação de Conexão Conselho Bíblico com permissão.