O conselheiro de “pavio longo”

Steve Midgley


Embora costumemos identificar certas pessoas como alguém de “pavio curto”, não usamos normalmente o que seria, de outro lado, o correspondente — o “pavio longo”. Literalmente, porém, é exatamente isso que 1Coríntios 13 identifica como a primeira qualidade do amor. A maioria das traduções modernas traz “o amor é paciente”, mas versões mais antigas, que trazem “o amor sofre longamente” (por exemplo, a versão em inglês American Standard Version), fornecem uma tradução mais literal do original. O amor, Paulo nos diz, tem “pavio longo” — ele suporta, ele persevera.

Um lugar onde encontramos referência à qualidade da paciência é na carta de Tiago. A carta começa com um chamado para sermos firmes, ou pacientes, diante de “várias provações” (Tg 1.2). Ela termina com uma exortação aos crentes para que “sejam pacientes até a vinda do Senhor” e reforça esse chamado citando a paciência de Jó (Tg 5.7, 11). Há momentos em que precisamos ajudar outros a terem paciência. No entanto, nós também precisamos aprender a ter paciência, até porque a paciência se revela uma qualidade muito necessária no ministério interpessoal.

Vamos considerar duas áreas cruciais em que aqueles que atuam no ministério de aconselhamento bíblico podem precisar aprender a ter paciência.

Paciência para ouvir
“Vocês sabem estas coisas, meus amados irmãos. Cada um esteja pronto para ouvir, mas seja tardio para falar e tardio para ficar irado” (Tg 1.19).

Às vezes, achamos muito, muito difícil continuar a ouvir. Queremos muito falar. O pecado de alguém está tão evidente, e a solução é tão óbvia que salta aos olhos. Ou, pelo menos, isso é o que nos parece e, em nossa impaciência, manifestamos nossa opinião e damos o conselho mais excelente que entendemos ter para dar. No entanto, com muita frequência, se estivéssemos dispostos a ter um “pavio longo” e desacelerássemos para fazer outra pergunta, descobriríamos que as coisas não são bem assim como parecem. Encontraríamos algo mais, que estaríamos perdendo: um sofrimento do passado que não havíamos descoberto ou a complexidade de um relacionamento que estava nos fugindo completamente. Essas são coisas que só conselheiros de “pavio longo” acabam descobrindo.

As advertências de Tiago sobre a língua parecem ser relevantes aqui. Ele enfatiza a necessidade de refrear, ou domar, a língua. Talvez uma maneira fundamental de demonstrarmos que temos “pavio longo” seja por meio da disposição de morder a língua! “Se alguém supõe ser religioso, mas não refreia a sua língua, está enganando a si mesmo; a sua religião é vã” (Tg 1.26). Segure a língua e ouça por mais tempo, parece ser o que Tiago está dizendo. Se insistirmos em expressar logo nossas opiniões, disparar nossos vereditos e apresentar nossos planos de ação, podemos estar enganados. Podemos nos convencer de que chegamos ao fundo da questão, quando, por não termos dedicado tempo para ouvir corretamente, não compreendemos realmente o coração de uma pessoa e falaremos algo errado.

Dada a forte advertência de Tiago de que palavras mal pensadas podem ser como uma faísca que dá início a um incêndio florestal, temos bons motivos para desacelerar e pensar duas vezes antes de falar.

Paciência com aqueles que são lentos para mudar
Uma segunda maneira pela qual podemos mostrar que temos um “pavio longo” é por meio da nossa persistência com pessoas que são lentas para mudar. É algo que nos faz distintamente parecidos com Deus, porque o Senhor “é paciente com vocês, não querendo que ninguém pereça, mas que todos cheguem ao arrependimento” (2Pe 3.9). Quer alguém viva de forma “desordenada”, esteja “desanimado” ou “fraco”, devemos ser “pacientes com todos” (1Ts 5.14). O original grego traz novamente a mesma palavra: “pavio longo”.

O capítulo final de Tiago contém vários apelos poderosos à paciência (Tg 5.7, 10-11). Parece provável, portanto, que Tiago estivesse pensando também à paciência nestas palavras finais: “Meus irmãos, se alguém entre vocês se desviar da verdade, e alguém o converter, saibam que aquele que converte o pecador do seu caminho errado salvará da morte a alma dele e cobrirá uma multidão de pecados” (Tg 5.19, 20). Como é a nossa paciência com aqueles que se desviam da verdade? Por quanto tempo perseveramos com aqueles que se mostram lentos em mudar ou que, talvez, não implementam os nossos “planos para mudança”? O que significaria ser parecidos com Cristo em tais situações?

A paciência importa
Sim, a paciência importa. Ela expressa nossa dependência de Deus e humildade diante dEle. Na verdade, ela envolve nossa disposição de nos submeter a Deus, pois significa reconhecer que Deus tem planos e tempos dos quais nada sabemos. Quando demonstramos paciência, refletimos o Deus que é “tardio em irar-se e grande em misericórdia e fidelidade” (Êx 34.6). Deus demonstrou abundante paciência para conosco. Como pensar que também não devamos demonstrar paciência uns para com os outros?

Às vezes, o “pavio longo” se manifesta na escuta paciente. Outras vezes, na maneira de discordarmos. Em ambos os casos, ela se expressa na pessoa que doma sua língua e fala com amor. Ela também se expressa na mansidão de espírito que se alegra em estender misericórdia e graça. Portanto, da próxima vez que decidirmos que é preciso “falar a verdade sem muitos rodeios”, talvez devamos parar para pensar. Talvez precisemos nos perguntar se isso é realmente “falar a verdade em amor” ou se é simplesmente uma evidência de que ainda não aprendemos a ter um “pavio longo”.


Perguntas para reflexão
1– Como vai a sua paciência? Quais situações de aconselhamento são mais propensas a testar a sua paciência?2– Como você pode procurar garantir que sua paciência se expresse no fazer mais perguntas?
3– Quão bem você equilibra o desejo de incentivar a mudança e o crescimento com a disposição de continuar a investir na pessoa que progride lentamente?


Steve Midgley é o diretor executivo da Biblical Counselling UK. Formou-se em medicina, pastoreou a Christ Church Cambridge por 18 anos, antes de deixar o pastorado para se concentrar inteiramente no trabalho do Biblical Counselling UK. É autor de vários livros na área de aconselhamento.


Original do artigo: Long-tempered?
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition.  Traduzido com autorização.