Cristo é central no meu aconselhamento?

Gary Hallquist


Deus quis dar a conhecer a riqueza da glória deste mistério entre os gentios, que é Cristo em vocês, a esperança da glória.  Este Cristo nós anunciamos, advertindo a todos e ensinando a cada um em toda a sabedoria, a fim de que apresentemos cada pessoa perfeita em Cristo. É para esse fim que eu me empenho, esforçando-me o mais possível, segundo o poder de Cristo que opera poderosamente em mim.  Cl 1.27-29

Lembro-me bem de uma lição profunda que um dos meus professores ensinou durante meus estudos de doutorado. Ele pediu à minha turma que avaliasse uma ordem de culto — completa com cânticos, oração, confissão, leitura bíblica, pregação, ofertas etc. — que ele distribuiu no início de uma das aulas. Verificamos os vários componentes e todos concordaram que eram teologicamente consistentes e tinham um bom fluxo. Em seguida, ele disse: “Ninguém percebeu que Cristo não é mencionado nem uma vez durante todo o culto? Os cânticos não mencionam Jesus. A passagem das Escrituras é do Antigo Testamento. Não poderia ter sido um bom culto judaico? De que maneira um descrente, presente em seu culto, saberia que Cristo é o objeto de sua adoração?” Ficamos totalmente envergonhados como turma. Como pudemos deixar passar o mais importante? Depois daquela experiência humilhante, acho que nunca mais deixei de perguntar “Onde está Jesus?” antes de concluir uma ordem de culto.

Jesus Cristo está ausente do meu aconselhamento?
É possível aconselhar alguém sem mencionar Cristo? É importante avaliarmos periodicamente o quanto Cristo é realmente o centro do nosso aconselhamento. Talvez precisemos enxergar um continuum no qual “Cristo está ausente” está em uma das extremidades e “Cristo é preeminente” na outra, e procurar determinar, efetivamente, em qual ponto nossos aconselhados diriam que estamos na maior parte do tempo. Algo que costumo dizer a mim mesmo é: “Existe um Salvador, e Ele não sou eu”. Incluídos na palavra “eu” deveriam estar meu conhecimento, meu treinamento, minha experiência, minha metodologia e meus diagnósticos. Não estou dizendo que essas coisas não sejam importantes. O que estou dizendo é que, se essas ferramentas não apontam o aconselhado para o Grande Médico, então o que estou fazendo não pode ser chamado adequadamente de aconselhamento bíblico, porque o objetivo final da Bíblia é mostrar Jesus Cristo às pessoas.

Cristo em nós, a esperança da glória
O fato de Cristo estar em mim – e o fato consequente de que eu estou em Cristo – é a minha maior esperança. Meu maior problema é que eu estou em mim e, portanto, minha única esperança vem do grande presente que me é dado na salvação — Cristo vem viver em mim para que o anseio do meu coração regenerado possa se concretizar, e o anseio do meu coração não regenerado possa ser erradicado. Pelo “poder de Cristo que opera poderosamente em mim” (Cl 1.29), estou sendo transformado à semelhança de Cristo. Visto que Jesus viveu uma vida de perfeita justiça, e eu estou em Cristo, fui justificado e sou eternamente aceito por Deus!

Como é o aconselhamento em que Cristo é o centro?
Em primeiro lugar, ele é voltado para o evangelho. O pecado pessoal e sua cura devem ser um tema constante do aconselhamento bíblico, sem que para isso minimizemos o sofrimento. A beleza da fé cristã é que existe um remédio para o pecado — o sangue de Jesus. Nenhuma outra religião oferece essa esperança. Nenhuma psicoterapia, nenhuma prática baseada em neurociência, nenhum medicamento pode remover o pecado, mas somente a confissão, o arrependimento, o perdão e a purificação de Deus (1Jo 1.9). O pecado é terminal, mas também é curável. A solução é o evangelho — nada mais.

Em segundo lugar, ele é voltado para o relacionamento com Cristo. Não basta ter conhecimento a respeito de Jesus — precisamos conhecê-lO pessoalmente. Quanto mais tempo passamos com Ele, mais profundamente nos apaixonamos por Ele e mais somos transformados à Sua semelhança. É do conhecimento geral que nos tornamos parecidos com aqueles com quem convivemos. Portanto, é lógico que a quantidade de transformação que ocorre em nós seja diretamente proporcional à quantidade de tempo que passamos na presença de Jesus. Transformação não é uma obra que nós fazemos. É aquilo que acontece conosco de dentro para fora, à medida que o Rei Jesus, que habita em nós, expulsa os invasores do nosso coração. A vida da videira (Jo 15.1-8) fluindo através de nós produz fruto. É por isso que Gálatas 5.22 diz: “o fruto do Espírito é”, e não “o fruto do meu esforço é”.

Em terceiro lugar, a fé cristã é o foco. Nossa confiança, antes de tudo, deve estar no Salvador todo-suficiente, Jesus, que é a Palavra de Deus. Estudos mostram que o relacionamento entre conselheiro e aconselhado é importante. Nossa metodologia, nosso preparo, nossa sabedoria e discernimento… tudo isso é importante. O mais importante, porém, é que demonstremos nossa dependência de Cristo e nossa confiança nEle como o único fator indispensável para a plenitude e a cura de que o aconselhado necessita. Então, à medida que nossos aconselhados passam tempo conosco, eles devem se tornar pessoas que dependem cada vez mais de Jesus.

Conclusão
Acredito que o objetivo de Paulo de apresentar “cada pessoa perfeita em Cristo” descreve bem o objetivo do aconselhamento bíblico. Enquanto conselheiros bíblicos, devemos nos certificar de não separar a palavra “perfeito” — ou seja, maduro — da expressão “em Cristo”. Sem essas duas palavras, como as pessoas saberão a quem adoramos?

Perguntas para reflexão
1- Como posso encorajar meus aconselhados a passarem mais tempo na presença transformadora de Cristo?
2- Onde está meu aconselhamento no continuum entre “Cristo está ausente” e “Cristo é preeminente”?
3- Meu aconselhamento é voltado para o evangelho, para o relacionamento com Cristo e para a fé cristã? Qual aspecto precisa ser fortalecido?


Gary Hallquist é professor adjunto de Teologia Prática no Seminário Teológico Shepherds em Cary, Carolina do Norte. Recentemente, aposentou-se como pastor conselheiro na Igreja Shepherds em Cary, Carolina do Norte, onde serviu de 2009 a 2024. Atualmente, reside em Auburn, Alabama, e fundou a Christ-Centered Family Solutions. Possui doutorado em aconselhamento bíblico pelo Southeastern Baptist Theological Seminary.


Original do artigo: Is Christ Central to My Counseling?
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition.  Traduzido com autorização.