Aconselhando alguém que pratica a automutilação

Mark Shaw

Pele machucada e cicatrizes de cortes podem ser resultados da prática de automutilação. Muitas vezes, as pessoas próximas preocupam-se e se perguntam o que está acontecendo naquela vida  e até onde ela está ciente do comportamento que pratica. A pergunta imediata e insistente geralmente é: “Por que você se machuca propositadamente?”

Não é uma doença mental: a pessoa que pratica a automutilação não é “louca”

Aconselhados que praticavam a automutilação, e em cujo coração pude observar o Senhor operar, tinham motivos muito claros pelos quais deram início a um padrão de automutilação. Eles a usaram como um meio de lidar com a dor a que foram expostos na vida. 

A automutilação é um “mecanismo de enfrentamento” para a angústia mental e emocional, e tem implicações perigosas. Fisicamente, as lesões podem levar a problemas de saúde mais graves e prolongados. No entanto, as lesões proporcionam alívio temporário da dor, do desespero e do desapontamento com a vida de uma forma que faz sentido para quem se automutila. Espiritualmente, a automutilação pode ser um mecanismo falso para expiar os próprios pecados cortando-se. Os benefícios são imperfeitos, mas a percepção de algum alívio leva a pessoa a se cortar vez após vez. A automutilação pode se tornar um hábito, pode se tornar escravizadora e até viciante.

Para quem pratica a automutilação, a dor física autoimposta é uma forma de expressar, controlar e transferir a dor emocional daquele momento para uma dor física. O ciclo de pensamento é semelhante ao da dependência química: há uma excitação e até uma antecipação do que está por vir. Em seguida, quando a automutilação é praticada, a fisiologia do corpo responde ao corte produzindo analgésicos naturais. Deus projetou o corpo com mecanismos próprios que aliviam a dor do corte — é Sua graça para a humanidade — e as pessoas que se automutilam descobriram isso como uma solução temporária para a dor emocional.

As pessoas que tive oportunidade de aconselhar não são doentes mentais. Procuro ajudá-las a entender que não é assim que Deus planejou que lidemos com a dor. 

O alvo deve ser diferente

No aconselhamento bíblico, dizemos que o problema de apresentação, aquele que traz inicialmente o aconselhado até nós, não é o verdadeiro problema. Em outras palavras, o verdadeiro problema não é o comportamento externo de automutilação, mas as motivações do coração que impulsionam o aconselhado a essa prática. As oportunidades para recorrer à automutilação em busca de alívio sempre estarão presentes; no entanto, o alvo de obter alívio temporário não pode controlar aquela vida. Nosso alvo de vida é a glória de Deus, e isso deve se tornar o fator motivador no coração da pessoa que luta contra a automutilação.

No Antigo Testamento, povos que não conheciam a Deus cortavam-se nos funerais como uma forma de expressar a profunda tristeza e dor associadas à perda de um ente querido.  Eles não tinham esperança de vida eterna. Eles não tinham a promessa de redenção em que confiar. Eles não tinham a mensagem do evangelho em que confiar para o perdão de seus pecados. No entanto, em Cristo, Deus amou Seus filhos ordenando-lhes em amor que respondam de outra maneira à dor, à tristeza, ao sofrimento e à culpa. Deus quer que o Seu povo experimente a bênção de viver para Ele e se separar das práticas vazias deste mundo. O alvo de mudança para quem pratica a automutilação não deve ser diferente: separar-se das práticas deste mundo e fazer escolhas para glorificar ao Senhor. É uma escolha para toda a vida e a eternidade. 

Esperança e ajuda do evangelho

Amar a Deus e viver obediente em Seu caminho sempre começa por conhecer a Deus intimamente e estabelecer com Ele um relacionamento profundo e permanente de confiança. Obedecer ao único e verdadeiro Deus vivo, independentemente de seus sentimentos, requer fé. Muitas vezes, o desejo de controle da situação e autossuficiência está no âmago do comportamento de quem se automutila. No entanto, um conselheiro bíblico hábil ajudará o aconselhado, a partir de seu comportamento, a explorar a Palavra de Deus e discernir as motivações do seu coração que levam a seus comportamentos externos, e a aprender como agradar a Deus com novas respostas que o honrem.

Como conselheiro bíblico, amigo atencioso, pai, mentor ou pastor, você tem o privilégio de apontar àqueles que se automutilam a esperança eterna em Cristo. Não os envie simplesmente para profissionais seculares. Em vez disso, veja o aconselhamento bíblico como uma oportunidade para falar a verdade de Cristo em amor a alguém que luta com uma dor interior e procura aliviá-la com a prática da automutilação. Você tem a Palavra de Deus, o Espírito Santo e as boas novas da graça salvadora de Jesus que nos perdoa, faz de nós novas criaturas e nos dá acesso ao poder de mudar para nos tornar mais parecidos com Ele.


Mark Shaw é certificado pela Association of Certified Biblical Counselors  (ACBC) e atua como Diretor de Aconselhamento na Grace Fellowship Church em Florence, KY.


Original: Hope and Help for Self-Injurers
Artigo publicado pela Association of Certified Biblical Counselors.  Traduzido com autorização.