Quando o aconselhado procura nos enganar

Scott Stephens

Dias atrás, recebi um telefonema da Suzana, uma moça que tinha sido aconselhada por mim no passado. Suzana estava desesperada enquanto, em meio às lágrimas, dizia: “Roberto acabou de admitir para mim que não é cristão. Ele me disse que falou tudo aquilo que ele sabia que eu queria ouvir só para que eu me casasse com ele. Agora ele está tentando me fazer parar de ir à igreja; ele me critica e me humilha cada vez que menciono Jesus”.

Apenas um ano atrás eu havia passado oito semanas com esse casal, fazendo seu aconselhamento pré-matrimonial. Como pude não perceber que Roberto não era salvo?

Durante aquele aconselhamento, falamos especificamente sobre a conversão de cada um, sobre suas compatibilidades, os papeis do marido e da esposa, e o propósito do casamento. No decorrer dos encontros, discutimos seu futuro juntos, seus desejos, a chegada dos filhos e suas responsabilidade um para com o outro como casal. Além disso, tivemos conversas frequentes e detalhadas sobre fé, compromisso com Cristo e sobre o papel de cada um na igreja local.

Ainda assim, parece que esse homem nos enganou. Ele era tão convincente que enganou a mim e sua noiva. Ele conhecia as Escrituras, sabia como manipular nossa conversa para esconder suas verdadeiras motivações, e dizia ser seguidor de Cristo. Apenas um ano mais tarde, não muito depois da cerimônia de casamento, ele admitiu que estava mentindo a respeito de sua fé.

Como conselheiros bíblicos, há momentos em que encontramos aconselhados que escondem fatos, que nos enganam para evitar uma confrontação ou que simplesmente mentem. Geralmente, no decorrer do processo de aconselhamento é possível que venham à tona os fatos que estavam ocultando e suas motivações pecaminosas. Mas o que dizer dos aconselhados que nos procuram já com estratégias para nos enganar? Como podemos identificar aqueles que mentem descaradamente para nós com a motivação de alcançar objetivos pessoais? A motivação oculta de Roberto era casar-se com Suzana, e ele estava determinado a dizer e fazer o que quer que fosse necessário para alcançar esse objetivo.

O fato de que Roberto me enganou incomodou-me tanto que procurei um conselheiro bíblico mais experiente e sábio para ouvir seu conselho. Esse conselheiro lembrou-me de que uma razão pela qual falhamos nos aconselhamentos é que chegamos a conclusões apressadamente. A única maneira de identificar o engano no decorrer do processo de aconselhamento é fazer mais perguntas intensiva, que entram detalhadamente nos assuntos. Investir tempo na coleta de informações, bem como dar atividades práticas que garantam que o aconselhado passe tempo na Palavra de Deus, podem ser ferramentas efetivas na tentativa de descobrir as motivações daqueles que procuram nos enganar.

Algumas dicas para ajudá-lo a expor o engano
1- Seja muito específico nas suas perguntas. Não aceite respostas gerais ou vagas a respeito da fé e da vida cristã. É muito fácil aceitar as respostas clássicas da “escola bíblica dominical” como uma validação para a caminhada com Cristo. Existe uma grande diferença entre uma devoção sincera a Jesus e um conhecimentos de fatos sobre a Bíblia.

2- Faça perguntas que exigem que o aconselhado avalie as circunstâncias da vida por um ponto de vista bíblico e temente a Deus. Avalie o grau de maturidade espiritual do aconselhado enquanto responde às perguntas. Essa também é uma boa oportunidade para determinar se o aconselhado está mostrando o fruto do Espírito (Gl 5.22-26). Mateus 7.20-23 explica que pelos frutos conhecemos quem não pertence a Cristo.

3- Providencie tarefas práticas que lidam com as situações para as quais o aconselhado procurou ajuda, mas tome cuidado para que todas as tarefas estejam focadas no relacionamento pessoal com Jesus Cristo. A Palavra de Deus é poderosa e irá cumprir o propósito que Deus tem (Is 55.11; Hb 4.12, 13). Certifique-se de que a tarefa esteja fundamentada no estudo da Palavra de Deus.

4- Um dos principais objetivos que temos como conselheiros bíblicos é glorificar a Deus e exaltar a Cristo em nosso aconselhamento. O aconselhamento é um instrumento para a obra do Espírito Santo. Todo o aconselhamento, incluindo as tarefas práticas, deve apontar para Cristo. Portanto, tanto ensinar quanto apresentar o evangelho devem ser componentes chaves em cada encontro de aconselhamento.

Jesus contou uma parábola, explicada em Mateus 13.24-30, que nos mostra que haverá falsos cristãos nas igrejas. Tomando isso como verdade, não deveria ser nenhuma surpresa encontrar alguém assim nos nossos aconselhamentos. Quando encontramos alguém enraizado na mentira, devemos ter em mente que é o Espírito Santo que pode transformar o coração do nosso aconselhado.

Ao aconselhar com as Escrituras, devemos estar cheios de sabedoria e discernimento durante todas as fases do aconselhamento. Seja muito cuidadoso para não pegar atalhos e chegar a pressupostos que podem resultar em ser enganado por falsos cristãos que procuram conselhos com a motivação de alcançar objetivos pessoais e, ao mesmo tempo, entenda que é somente Deus que pode ver claramente e discernir o coração de cada pessoa.

Um último conselho: eu o encorajo fortemente a encontrar um conselheiro bíblico mais experiente e sábio com quem você possa conversar sobre seus sucessos e falhas no aconselhamento. Esforce-se também para reunir um grupo de conselheiros bíblicos próximos de você e com os quais você possa compartilhar, dar e receber conselhos, encorajamento e treinamento.


Scott Stephens é fundador e diretor do Covenant Counseling Center em Greenville, SC. Ele é certificado pela ACBC, é um dos pastores que atua no centro de aconselhamento da Pendleton Street’s Baptist Church em Greenville, membro do conselho do Redeemer Biblical Counseling Training Institute e cursa o doutorado em aconselhamento bíblico no Southwestern Baptist Theological Seminary.



Original: Counseling the Deceptive Counselee
Artigo publicado pela Association of Certified Biblical Counselors.  Traduzido com autorização.
Tradução: Camilla Rezende Bastos
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico