Julyana Neris
Há alguns anos eu me descobri uma pessoa orgulhosa. Não queria admitir, óbvio, mas era fato ainda que eu me justificasse de diversas maneiras. Por exemplo, “Eu não me acho melhor do que os outros, é só que eu tenho o meu jeito de fazer as coisas” ou “Eu não tenho problemas em pedir perdão, mas nesse caso eu não estou errada!”. Chegou a hora em que não deu mais para negar, a Palavra de Deus começou a penetrar no meu coração e a apontar que existia uma pessoa orgulhosa ali. Já estava na hora de admitir, confessar e mudar.
Assim como eu, talvez você esteja pronto para afirmar que é orgulhoso. Ou talvez você pense que esse texto não é para você, pois sempre achou muito fácil alegrar-se com as conquistas dos outros, pedir ajuda quando necessário, doar tempo para as pessoas à sua volta, pensar antes nos outros que em você. Talvez você sempre tenha feito isso com muita naturalidade. Bom, meus parabéns, mas esse não é o meu caso. Foi somente depois de muita reflexão e muitos “tapas na cara” que descobri que era necessário admitir meu orgulho e que eu precisava do Senhor para me transformar. Com isso, descobri algumas coisas sobre o orgulho que gostaria de compartilhar com você, listando alguns sinais que mostram como muitas vezes convivemos tão bem com o orgulho sem perceber.
1- Acho meu orgulho tolerável
Claro que o pecado tem graus de seriedade, mas em última análise, pecado é pecado. É uma conduta inapropriada a santos. [1]
Pois é. Há algumas semanas, eu me deparei com essa frase e percebi que eu não tinha a consciência de que meus pequenos pecados desagradavam a Deus. No fundo, eu sabia que era pecadora, mas esse fato não me incomodava, pois pensava que o pecado dos outros era sempre maior. Assim foi com o orgulho, eu sabia que era orgulhosa, mas quem escapa? Tem muita gente pior do que eu, não é mesmo? Ainda assim, pecado é pecado! Mesmo que meu orgulho não fosse tão visível, ele não só desagradava as pessoas à minha volta, mas ele desagradava a Deus, e isso devia me mover a não querer mais pecar.
Os pecados aceitáveis são sutis porque nos enganam e nos levam a pensar que não são tão maus assim ou simplesmente que não são pecados, ou – pior ainda – porque nos induzem a não pensar neles de modo nenhum! [2]
Muitas vezes, queremos dar um nome bonito àquilo que, em sua essência, é pecado. “Estou apenas mostrando meu ponto de vista“, “É a minha privacidade“, e assim por diante. Aquilo que falamos reflete o que está em nosso coração, pois “a boca fala do que está cheio o coração” (Mt 12.34). Se ainda resta dúvida, orgulho é pecado, sim! “Olhar altivo e coração orgulhoso, a lâmpada dos perversos, são pecado” (Pv 21.4). Pior ainda, o orgulho é um pecado detestável para Deus: “O Senhor detesta os orgulhosos de coração. Sem dúvida serão punidos” (Pv 16.5).
Se você está em dúvida, sem saber se o orgulho faz parte da sua vida, pare para pensar em quantas vezes você decide fazer algo porque é o melhor para você, quantas vezes pensa em você durante o dia, quantas vezes reclama de algo que o desfavorece. O orgulho está ligado essencialmente ao egoísmo, à admiração pelo próprio mérito, arrogância, soberba. A Bíblia nos diz que devemos ter um conceito equilibrado de nós mesmos:
Pois pela graça que me foi dada digo a todos vocês: ninguém tenha de si mesmo um conceito mais elevado do que deve ter; mas, pelo contrário, tenha um conceito equilibrado, de acordo com a medida da fé que Deus lhe concedeu. Assim como cada um de nós tem um corpo com muitos membros e esses membros não exercem todos a mesma função, assim também em Cristo nós, que somos muitos, formamos um corpo, e cada membro está ligado a todos os outros (Rm 12.3).
Será que o objetivo da sua vida tem sido realmente apontar para a glória de Deus? Ou será que tem sido mais parecido com apontar para a sua glória, aquilo que você faz, o seu currículo, os seus bens? Cuidado: “O orgulho vem antes da destruição; o espírito altivo, antes da queda” (Pv 16.18).
É difícil admitir, mas muitas vezes somos como o fariseu de Lucas 18.11, que agradece por não ser tão pecador quanto o publicano. Nem sempre fazemos isso com nossas palavras, mas é o que demonstramos com nossas ações. Assim, quando entendo que todos os meus pecados carecem do perdão de Deus (Rm 3.23) e que a simples infração de um “pecadinho” sequer me faz merecer a morte (Rm 6.23), percebo que meu orgulho deve ser tratado com seriedade.
Quando percebemos como a notícia ruim é má, teremos mais capacidade de entender como a notícia boa é ótima.[3]
Quando a ficha caiu para mim, comecei a pedir perdão a Deus pelos pecados escondidos no meu coração, um por um, dia após dia. Quando damos nome aos bois, percebemos que na verdade não somos tão bons quanto achávamos que éramos, e a mensagem da cruz passa a ter um novo significado quando percebemos que, de fato, precisamos de salvação.
2- Acho que sou melhor do que os outros
Sim. Isso também foi difícil de admitir, mas eu me acho melhor do que os outros.
Um dos problemas com o orgulho é que o enxergamos nas outras pessoas, mas não em nós mesmos. Estou bastante ciente da pergunta de Paulo: “Tu, pois, que ensinas os outros, não ensinas a ti mesmo? Tu, que pregas que não se deve furtar, furtas?” (Rm 2.21).[4]
É engraçado como percebemos tão facilmente o pecado na vida dos outros, e ao mesmo tempo é difícil olhar para dentro de nós mesmos e, ao perceber o pecado (passo difícil), humilharmo-nos e pedirmos perdão (mais difícil ainda) com o coração entristecido por termos quebrado o padrão estabelecido por Deus (quase impossível), sabendo que Ele é fiel e justo para nos perdoar (1 Jo 1.9). Assim como Davi diz no Salmo 32.3-6,
Enquanto calei meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim e o meu vigor se tornou em sequidão de estio. Confessei-te o meu pecado e a minha iniquidade não mais ocultei. Disse: confessarei ao Senhor as minhas transgressões; e tu perdoaste a iniquidade do meu pecado. Sendo assim, todo homem piedoso te fará súplicas em tempo de poder encontrar-te. Com efeito, muitas águas, não o atingirão.
Muitas vezes pensei que aquilo que eu fazia diante dos outros determinava quem eu era. Por fora, eu até podia apresentar uma falsa humildade quando as pessoas me exaltavam pelas minhas realizações, mas no fundo aquilo enchia meu ego. Minha segurança estava no bom desempenho acadêmico nos cursos que fiz, nas habilidades que desenvolvi. Ao mesmo tempo, muitas vezes eu me via em crise por não saber como me sobressair diante de tantas pessoas tão ou mais habilidosas do que eu. Eu me esquecia de que não tenho nada que não me tenha sido dado: “Assim, ninguém se orgulhe a favor de um homem em detrimento de outro. Pois, quem torna você diferente de qualquer outra pessoa? O que você tem que não tenha recebido? E se o recebeu, porque se orgulha, como se assim não fosse?” (1 Co 4. 6,7).
Tudo muda quando você entende que o seu objetivo não é se destacar, não é ser original nem deixar uma grande marca pessoal. Jesus já deixou essa marca e nosso propósito é fazê-la conhecida.
Assim diz o SENHOR: Não se glorie o sábio na sua sabedoria, nem o forte, na sua força, nem o rico, nas suas riquezas; mas o que se gloriar, glorie-se nisto: em me conhecer e saber que eu sou o SENHOR e faço misericórdia, juízo e justiça na terra; porque destas coisas me agrado, diz o SENHOR (Jr 9.23,24).
Tudo aquilo que você e eu recebemos deve ser usado para exaltar o nome de Deus e não o meu. Os resultados daquilo que faço são fruto da graça de Deus em minha vida e não do meu esforço. Entender isso muda tudo.
3- Eu não confio em Deus
Sim! Posso cantar que confio, aconselhar as pessoas a fazerem isso e até mesmo afirmar que confio, mas não é isso que minhas atitudes dizem. Se eu de fato confiasse em Deus, não buscaria me apoiar no meu próprio entendimento (Pv 3.5,6). Minha falta de fé naquilo que a Bíblia diz a respeito da obra de Cristo, de quem eu sou e da transformação que Ele opera, faz com que minha vida se caracterize mais pela impiedade do que pela santidade. Impiedade pode ser definida como viver sem pensar, ou pensar pouco, em Deus, na vontade de Deus, na glória de Deus ou na dependência de Deus. É como se Deus ficasse fora do quadro.
Muitas vezes, eu me pego tomando decisões sem ao menos considerar o que Deus diz a respeito daquele assunto. Isso demonstra em quem o meu coração está apoiado: em mim mesma, nos meus próprios “achismos” ou, até mesmo, no método da tentativa e erro. Tudo isso porque acho que sei mais do que Deus, acho que Ele não foi inteligente o bastante ao me deixar a Bíblia ao invés de um livreto que me desse vontade de ler, e confio mais no que os outros dizem do que no que Deus diz.
Deus diz: “Não seja sábio aos seus próprios olhos, tema o Senhor e evite o mal” (Pv 3.7). Não ache que você sabe o que está fazendo. Lembro-me de uma amiga que me procurou inúmeras vezes para falar da necessidade que ela tinha de ser amada por um namorado. Ela se apaixonava por vários rapazes, inclusive incrédulos, e sempre estava com medo de ser magoada. Quando sugeri que buscássemos na Bíblia o que Deus diz a respeito do assunto, ela demonstrou pouco interesse. Mesmo que eu mostrasse para ela as orientações de Deus esperava, ela continuava a procurar desculpas para se justificar. Hoje ela está em um “relacionamento sem definição” com um descrente, pensando que essa pode ser a vontade de Deus. Nosso orgulho muitas vezes nos impede de confiar em Deus, de confiar que obedecer a Ele é o melhor mesmo que eu fique pra titia, mesmo que eu sofra ou que eu tenha que sacrificar algo.
4- Importo-me mais com o que os outros pensam do que com o que Deus pensa
Existem várias formas de orgulho e eu, provavelmente, encaixo-me em várias delas. Uma delas, que é bastante comum, é o orgulho das realizações. Aquele tipo de orgulho que faz com que você molde suas atitudes de acordo com o quanto de elogio você poderá receber, levando a pensar que você é o grande responsável pelas realizações e projetos bem-sucedidos.
Dois princípios encontrados na Bíblia nos ajudarão a evitar o desejo pecaminoso de ser elogiado. Primeiro, vamos nos lembrar das palavras de Jesus em Lucas 17.10: ‘Assim também vós, quando fizerdes tudo o que vos for ordenado, dizei: Somos servos inúteis; fizemos somente o que devíamos fazer.’ Quando realizarmos bem uma tarefa ou tivermos servido fielmente por um longo tempo, nossa atitude deve ser esta: “Só cumpri a minha obrigação”.[5]
Provérbios 29.25 é um fato: “Quem teme a homens arma ciladas, mas quem confia no Senhor está seguro”. Talvez seja estranho pensar que ter orgulho das próprias realizações possa levar a temer as pessoas. Muitas vezes, porém, agimos em busca da aprovação das pessoas, e essa aprovação aumenta nosso orgulho, pensando que os aplausos que recebemos são fruto da nossa própria capacidade. Dessa forma, aquilo que fazemos não é determinado pelo que Deus vai pensar de nós, mas no que as pessoas irão pensar. Quando vivemos para agradar aos outros, viramos escravos das pessoas. Tornamo-nos pessoas inseguras e instáveis, enquanto a nossa confiança deveria repousar em Deus.
Muitas vezes, nós nos esquecemos de que somos apenas coadjuvantes na história, e que o papel principal é de Cristo. Precisamos entender que nosso orgulho ofende não só as pessoas, mas ofende a Deus. É preciso não só deixar o orgulho, mas nos tornarmos pessoas humildes: “Humilhai-vos, portanto, sob a poderosa mão de Deus, para que ele, em tempo oportuno, vos exalte, lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós” (1Pe 5.6-7). Quando nos humilhamos perante Deus e reconhecemos nosso pecado, a Bíblia nos afirma que Ele não só nos perdoa como nos transforma. Assim, quando nos arrependemos genuinamente, nossas atitudes atestam nossa mudança. Essa mudança não é mais para que os outros nos vejam com bons olhos, mas é consequência de um coração que teme a Deus.
Que, quanto ao trato passado, vos despojeis do velho homem, que se corrompe pelas concupiscências do engano; e vos renoveis no espírito da vossa mente; e vos revistais do novo homem, que segundo Deus é criado em verdadeira justiça e santidade (Ef 4.22-24).
Para nós, orgulhosos de plantão, sabemos que o alvo deve ser buscar a humildade.
Isso porque a essência da humildade resultante do evangelho não é pensar em mim mesmo como se eu fosse mais, nem pensar em mim mesmo como se fosse menos; é pensar menos em mim mesmo. A humildade do evangelho mata a necessidade que tenho de pensar em mim. Não preciso mais ligar as coisas à minha pessoa“.[6]
Quando nos esquecermos de pensar em nós mesmos e passarmos a pensar em Deus e nos outros, saberemos que estamos no rumo certo.
[1] BRIDGES, Jerry. Pecados intocáveis. São Paulo: Vida Nova, 2012. p. 15
[2] Idem, p.25.
[3] Idem, p. 26.
[4] Idem, p. 85.
[5] Idem, p. 92
[6] KELLER, Timothy. Ego transformado. São Paulo: Vida Nova, 2014. p. 34.
Julyana Neris foi aluna do Curso de Liderança e Discipulado (CLD) da Organização Palavra da Vida, e é formada em jornalismo.
Artigo publicado originalmente em Jovem Crente. Material republicado com autorização.