Brady Goodwin
Uma das minhas maiores alegrias no ministério é aconselhar à luz da esperança do evangelho. Por meio das muitas oportunidades que tenho para aconselhar, sou relembrado quase que diariamente do poder das Escrituras para transformar, da obra de Deus de formar o caráter de Cristo na vida de Seus filhos.
Há dias em que encerro os encontros de aconselhamento fortalecido em minha fé por ter caminhado com outros santos que também lutam para confiar e honrar a Deus em meio à dor dos problemas da vida. No entanto, há também aqueles dias em que fico desencorajado, dias em que não tenho certeza de ter dito algo útil, dias em que luto contra pensamentos de inquietude, que questionam minhas habilidades como conselheiros, dias em que fico convencido de que outra pessoa poderia ter ajudado muito melhor do que eu aquele aconselhado sentado à minha frente. Esse sentimento de frustração não é facilmente observável, mas ele é real e vem do meu próprio coração frente a dada circunstância.
Talvez você já tenha passado por algo parecido. Apesar de não presumir que seja algo generalizado, percebi que esses sentimentos não são incomuns entre aqueles conselheiros que mentoreio. Presumo que você também já tenha tido dias nos quais duvidou de seu papel e efetividade como conselheiro. Logo, com base nesse pressuposto, eu lhe faço duas perguntas. Primeira: O que explica essas experiências do coração do conselheiro? Segunda: Como podemos lidar com as dúvidas e o desânimo no ministério, e devidamente colocar nossa fé no Senhor?
Diagnosticando nossa inquietude no ministério
Apesar de nossas circunstâncias e motivações serem diferentes, a Palavra de Deus mostra que o desencorajamento, nos casos que mencionei acima, é muitas vezes fruto de colocarmos nossa identidade no lugar errado. Esse deslocamento da identidade expressa-se por meio do desejo de buscar aceitação e afirmação não em Deus, mas naqueles a quem aconselhamos.
Considere um possível cenário. Você chega ao final de um encontro de aconselhamento ou de uma conversa de cunho ministerial e, depois de alguma reflexão, você começa a sentir aquele eco familiar de inquietação. Você se pergunta: Será que aquilo que falei é certo? Será que eu usei a passagem bíblica adequada? Será que meu amigo ou aconselhado recebeu a ajuda de que necessitava? Embora nosso objetivo, com certeza, deva ser o de ter habilidade para oferecer conselhos bíblicos proveitosos , tal desejo pode também se elevar a um grau de destaque injustificável.
Em outras palavras, nosso desejo de ser habilidoso ou de ser visto pelos outros como habilidoso pode, na verdade, ofuscar nosso chamado para amar a Deus e confiar nEle ao ministrar. Em tais momentos, nossa ansiedade revela o que o nosso coração realmente deseja (Mt 6.19-21). Queremos oferecer um bom conselho, mas talvez por motivos egoístas. Em vez de oferecer livremente aquilo que recebemos em Cristo, nós nos vemos presos pelo nosso desejo de receber elogios das pessoas. Em outras palavras, tememos a homens e não a Deus (Pv 29.25).
Qual é o impacto que essa disposição do coração tem em nosso ministério quando não lidamos com a verdade do evangelho? A princípio, os efeitos visíveis são mínimos. Podemos até ter conhecimento bíblico e teológico o suficiente para ainda usar as “palavras certas” ao falar com aqueles com os quais nos importamos. Nossos aconselhados podem ainda se sentir amados e ajudados por meio do nosso ministério. A Palavra de Deus ainda é usada pelo Espírito Santo para efetuar mudanças de acordo com a necessidade (Is 55.11).
No entanto, um coração dirigido pelo desejo de receber a aprovação das pessoas irá, no final das contas, agir de acordo com aquilo que lhe traz tal aprovação. Quando o temor a homens nos direciona, é provável que deixemos de falar toda a verdade (Ef 4.15). Em lugar de palavras firmes que promovem cura, seremos tentados a falar “paz, paz” onde não há paz (Pv 27.6; Jr 6.14). Em lugar de oferecer graça e conforto do Redentor, encorajaremos o aconselhado a agir pelo esforço próprio, pois é exatamente isso o que nós estamos fazendo (Gl 3.3). Enquanto isso, nossa angústia permanecerá, já que continuaremos a silenciar o toque do Espírito Santo com nossa busca por glória pessoal De fato, “quem teme o homem cai em armadilha” (Pv 29.25).
Respondendo à inquietude como filho ou filha de Deus
Relembre o cenário de antes. Agora que estamos cientes das motivações erradas do coração que estão guiando seu ministério, como responder a elas? Em outras palavras, como deixar de aconselhar para obter a aprovação de pessoas e passar a aconselhar como filhos de Deus?
Em primeiro lugar, devemos nos lembrar de nos apropriar da realidade de que somos salvos pela graça de Deus. Apesar de parecer algo rudimentar, a presença da ansiedade e do desânimo que consideramos inicialmente demonstra que nosso entendimento dessa verdade fundamental talvez esteja distorcido. Colossenses 2.6-7 nos instrui que “assim como vocês receberam a Cristo Jesus, o Senhor, continuem a viver nele, enraizados e edificados nele, firmados na fé, como foram ensinados, transbordando de gratidão”. Devemos, portanto, voltar à maravilha do evangelho e ministrar exclusivamente a partir dessa base.
Em segundo lugar, devemos nos arrepender do nosso desejo de ter uma identidade enraizada em qualquer outra coisa que não seja o amor de Deus em Cristo. Isso provavelmente exigirá que aprendamos mais uma vez a descansar na identidade que recebemos como filhos de Deus em Cristo. Em resposta a um povo rebelde, no livro de Isaías, Deus disse: “No arrependimento e no descanso está a salvação de vocês, na quietude e na confiança está o seu vigor, mas vocês não quiseram” (Is 30.15). Em vez de ficarmos exaustos nessa busca por afirmação vinda de pessoas, podemos descansar, sabendo que Deus já demonstrou Seu amor por nós em Jesus, e Seu coração para conosco é o coração de um pai para com Seus filhos.
Em terceiro lugar, devemos aprender a ver a tentação de medir nosso valor pelos elogios que recebemos dos outros como qualquer outra tentação que enfrentamos. Podemos, então, crescer em nossa habilidade de responder a essa tentação pela graça de Deus, e na dependência do Espírito Santo, resistindo ao chamado para trocar Sua aprovação pela aprovação de outros (1 Co 10.13). Esse esforço caminha lado a lado com o descanso em nossa identidade como filhos de Deus. Enquanto descansamos, também lutamos contra a tentação de agir de maneira contrária a quem somos por meio do sacrifício de Cristo.
Em quarto lugar, nós nos alimentamos regularmente da Palavra de Deus a fim de nos deleitar em Suas palavras para nós (Sl 1.1, 2). Nunca devemos nos aproximar das Escrituras, ou de qualquer outra disciplina espiritual, com uma perspectiva de alcançar méritos. Em vez disso, devemos ir ao Senhor em Sua Palavra para nos satisfazer nEle e para que nosso coração fique fortalecido e protegido contra o pecado e a incredulidade (Sl 19.7; 119.11). Descansar em Deus dessa maneira reforça nosso apego à nossa identidade em Cristo, ao mesmo tempo em que fortalece nossa ênfase no evangelho ao aconselhar outros.
Em quinto e último lugar, nós nos esforçamos para ser ” imitadores de Deus, como filhos amados” (Ef 5.1, 2). Assim como procuramos ver esse objetivo ser alcançado na vida de nossos aconselhados, nós nos esforçamos para também ser exemplo disso. À medida que andamos em amor, seguindo o exemplo de Cristo, somos equipados para oferecer aos aconselhados tanto consolo quanto correção à luz da esperança do evangelho. Ficaremos protegidos das tendências egocêntricas de evitar os conselhos dados com firmeza e mesmo tempo, ao longo do caminho, seremos também ricos de misericórdia para com nossos irmãos e irmãs em Cristo, assim como nosso Pai age para conosco. Daremos o que nós mesmos recebemos. Nossos aconselhados receberão a graça do evangelho e serão fortalecidos como filhos de Deus à medida que buscarem a Deus em amor e fé.
Embora o desânimo e a inquietação possam revelar verdades duras sobre nosso coração, podemos encontrar descanso em nossa verdadeira aceitação como filhos de Deus. Que possamos aconselhar e ministrar a outras pessoas nessa mesma graça!
Perguntas para reflexão
Como você percebe que o temor a homens impacta seu ministério de aconselhamento?
De que maneira Deus o tem ajudado a crescer na fé cristã ao basear a sua identidade somente em Cristo?
Como você pode usar a sabedoria da Palavra de Deus para encorajar outras pessoas a viverem como filhos amados de Deus?
Brady Goodwin atua como pastor de aconselhamento na Northway Church em Dallas, Texas. É formado pelo Dallas Theological Seminary (Th.M.) e pelo Southern Baptist Theological Seminary (D.Min. em Aconselhamento bíblico). É membro certificado da Association of Certified Biblical Counselors (ACBC).
Original: Counseling from God’s Acceptance, Not for the Acceptance of Others
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition
Tradução: Camilla Rezende Bastos.
Revisão: Conexão Conselho Bíblico