Kyle Gangel
O que o irrita mais? Alguém que ocupa por muito tempo o banheiro pela manhã? O WiFi que cai? Seu time favorito que perde um pênalti no final do jogo? O trânsito? As crianças gritando? As oportunidades para ficar irritado parecem ser infinitas, e todas podem acontecer em um único dia!
Eu me surpreendo, muitas vezes, com o pouco que é preciso para ficar frustrado com as circunstâncias ou com as pessoas ao meu redor. Em minha irritabilidade, percebo uma grande disparidade entre o tamanho do meu problema e a extensão da minha reação. Muitas vezes, eu me pergunto se eu reagiria de maneira mais agradável a Deus diante de uma verdadeira tragédia em minha vida do que quando piso em um brinquedo abandonado por meus filhos no meio do caminho. Tenho certeza de que não estou sozinho nisso. Para muitos de nós, existe uma expressão raivosa à espreita logo abaixo da superfície, pronta para saltar ao menor inconveniente. Antes de termos tempo para parar e pensar, já expressamos nosso descontentamento com palavras cortantes, um olhar penetrante, um suspiro de descontentamento ou um desprezo silencioso. Nós nos perguntamos a razão de tamanho mau humor. De onde vem isso?
Um problema interno
Todos nós já vimos e rimos das piadas sobre o café que circulam nas redes sociais:
“Não fale comigo até eu tomar minha xícara de café.”
“Meu colega de trabalho favorito é a cafeteira.”
“Como se aproximar de mim antes de eu tomar café? Impossível!”
Quando se trata de irritabilidade, o café ajuda, mas não é a solução. Esses e outros memes parecidos são tentativas jocosas de atribuir nossa irritabilidade a algo externo a nós. A fonte de nossa irritabilidade é muito mais profunda. A Bíblia nos lembra que esse comportamento flui de dentro de nós. Salomão enfatizou isso ao dizer: “Acima de tudo, guarde o seu coração, pois dele depende toda a sua vida.” (Pv 4.23). A dura verdade é que ficamos irritados quando as circunstâncias da nossa vida e as pessoas ao nosso redor não correspondem às nossas expectativas ou desejos (cf. Tg 4.1, 2). As pessoas que Deus colocou ao nosso lado para que as amemos tornam-se obstáculos no caminho para conseguir o que queremos. Quando não conseguimos o que tanto queremos, nós nos lançamos em um ataque verbal rápido, punimos com o tratamento silencioso, isolamo-nos dos outros ou fazemos beiço. Por fora, a irritabilidade de cada um de nós pode se expressar de maneira diferente, mas a raiz é sempre a mesma – queríamos algo que não conseguimos ter.
É necessário admitir que nossa irritabilidade é um problema de pecado no nosso interior, não é um problema externo. Esse reconhecimento é um passo importante para a mudança. Quando sabemos a origem do nosso problema, podemos encontrar soluções reais. Por exemplo, meu filho mais velho, Brennan, certa vez fechou a mão esquerda do irmãozinho numa porta de correr de vidro. Harrison começou a gritar de dor, pois sua mão estava presa. Brennan, ciente de que algo estava errado, começou a examinar com afinco seu irmão para descobrir o que estava lhe causando angústia. Brennan examinou cada centímetro quadrado de Harrison, exceto a mão do bebê que estava presa. Como Brennan não conseguia identificar a verdadeira origem do problema, suas soluções foram inadequadas. O mesmo acontece com nosso crescimento cristão. Se identificarmos a irritabilidade como um problema externo, trabalharemos para mudar nossas circunstâncias, ou pior, exigiremos que as pessoas se ajustem à nossa vontade. Saber o verdadeiro problema leva a soluções reais.
Por onde começar
Lembre-se da esperança do evangelho. A irritabilidade é sempre autocentrada. Felizmente, em Cristo, fomos libertos de viver para nós mesmos e temos a capacidade de viver como Ele – paciente, bondoso, manso (cf. 2Co 5.15). Por causa de Cristo, podemos agradar a Deus mesmo em meio a circunstâncias ou pessoas difíceis.
Faça boas perguntas. Procure discernir exatamente o que você está querendo quando está irritado. Como diria G.I. Joe[1], “conhecer é metade da batalha”. Fazer perguntas simples como “O que estou querendo agora?” ou “O que mudaria meu humor agora se eu pudesse estalar os dedos e conseguir?”. No meu caso, a resposta costuma ser uma vida confortável. Quero viver em uma tranquilidade ininterrupta. Quando isso fica ameaçado – tenho três meninos em casa para ameaçar minha tranquilidade – posso ficar irritado. Para outros, o que desperta irritação pode ser um desejo excessivo de respeito, amor, atenção, sucesso, segurança, ordem, e assim por diante.
Olhe o que está por trás. Conhecer as motivações do coração que estão por trás de sua irritabilidade permite que você se arrependa mais especificamente diante de Deus e dos outros. Em lugar de simplesmente pedir desculpas, o mais certo é dizer: “Perdoe-me por desejar tanto ter uma vida confortável que fiquei frustrado quando você precisou da minha ajuda”. Reconhecer o pecado real o impede de culpar os outros ou as pressões circunstanciais.
Expresse gratidão. É difícil ser grato e mal-humorado ao mesmo tempo. Quando o apóstolo Paulo quis exortar os crentes colossenses a “suportar uns aos outros”, ele mencionou três vezes a gratidão (cf. Cl 3.12-17). Mesmo que tudo esteja desmoronando ao seu redor, você pode ser grato por Cristo, pelo evangelho, pela obra santificadora do Espírito em você, pelo cuidado e preocupação do Pai com você, entre muitas outras bênçãos que temos em Cristo.
Coloque seus olhos em Cristo
No documentário Free Solo, podemos ver Alex Honnold subir cerca de mil metros em linha reta até a rocha de granito do El Capitan de Yosemite, na Califórnia. Ele escalou sem a segurança de cordas e âncoras. Em outras palavras, um deslize, um erro, e ele teria despencado para a morte. Naturalmente, muitos lhe perguntaram como ele controlou o medo enquanto se pendurava em um penhasco a centenas de metros acima do fundo do vale. Ele disse que não tinha como objetivo eliminar o medo, mas ampliar sua zona de conforto. Para ele, concentrar-se em remover o medo teria sido algo ineficaz. Em vez disso, ele se dedicou ao preparo, prática e planejamento a ponto de se sentir confortável nas situações mais perigosas. Focar na remoção do medo produz mais medo.
Da mesma forma, focar nas circunstâncias e nas pessoas que cercam nossa irritabilidade apenas agrava o problema. Não podemos lutar contra nossa irritabilidade simplesmente nos concentrando em nossa irritabilidade. Em vez disso, devemos nos concentrar em Cristo, Sua obra por nós e em nós, todas as bênçãos que Ele nos deu, e descobriremos que nossa irritabilidade não pode prosperar ao lado da alegria que temos em Cristo.
[1] G.I. Joe é uma franquia americana de action figures, personagens plásticos que mudam facilmente de posição, produzida por uma empresa de brinquedos. No Brasil, a linha é conhecida como Falcon e Comandos em Ação.
Kyle Gangel é um dos pastores da Southern Hills Bible Church in Custer, South Dakota, e conselheiro bíblico certificado pela ACBC.
Original: Overcoming Irritability
Artigo publicado pela Association of Certified Biblical Counselors. Traduzido com autorização.