O perigo dos desejos desmedidos

Shannon Kay McCoy

“Por que Deus nos deu desejos?“, uma amiga perguntou. Ela estava indignada, lutando entre o desejo pelas coisas do mundo e o desejo pelas coisas de Deus. Ela pensava que poderia ser fácil servir a Deus se não tivesse outros desejos. Você já se sentiu assim? Eu já.

Deus nos deu a capacidade de ter desejos para que Ele possa ser o objeto dos nossos desejos. Ele quer que nós desejemos a Ele com todo o nosso coração, alma, força e entendimento (Lc 10.27). Desejo é um sentimento forte, uma aspiração, uma vontade ou um anseio, tanto bom quanto mal, que nos leva a buscar satisfação ou a possuir algo. O Espírito Santo que habita em nós capacita-nos para desejar a Deus. Entretanto, nós ainda lutamos contra os desejos da nossa própria natureza impura e pecaminosa.

Os desejos da carne e os desejos do Espírito
A Bíblia descreve dois tipos de desejo: os desejos da carne e os desejos do Espírito (Gl 5.17). Esses desejos estão em conflito. Nós não podemos servir a ambos ao mesmo tempo, e não existe um meio termo. Somos fiéis aos desejos do Espírito ou aos desejos da carne.

Os desejos do Espírito são aqueles que agradam a Deus: retidão, santidade e um viver piedoso. Os desejos do Espírito produzem um fruto viçoso de “amor, alegria, paz, paciência, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão, domínio próprio“ (Gl 5.22, 23).  Os desejos da carne são próprios da natureza humana imoral, perdida e fraca, e desagradam a Deus. Eles produzem frutos podres como “imoralidade sexual, impureza, libertinagem, idolatria, feitiçarias, inimizades, rixas, ciúmes, iras, discórdias, divisões, facções, invejas, bebedeiras, orgias e coisas semelhantes a estas“ (Gl 5.19-21).

A idolatria dos desejos desmedidos
Os desejos da carne são desejos desmedidos, desejos ardentes e cobiçosos de coisas terrenas. O apóstolo Paulo diz em Colossenses 3.5: “Façam morrer tudo o que pertence à natureza terrena: imoralidade sexual, impureza, paixões, maus desejos e a avareza [cobiça], que é idolatria”. A cobiça é idolatria porque coloca os nossos desejos egoístas acima da obediência a Deus.
Os desejos da carne desmedidos produzem ídolos, ou seja, objetos dos nossos desejos que tomam o lugar de Deus no nosso coração. John Piper escreveu que desejar qualquer coisa com maior intensidade do que desejamos a Cristo é a própria essência do pecado.[1] O pecado da idolatria é colocar toda nossa confiança em qualquer coisa ou qualquer pessoa que não Deus. Nós não precisamos de imagens esculpidas para sermos idólatras. Nosso coração é uma fábrica de ídolos que produz diariamente  adoração a coisas erradas.

O objeto dos nossos desejos desmedidos
Nossos desejos desmedidos nos motivam a agir. Nós buscamos obter um objeto material ou imaterial, que acreditamos que irá satisfazer nossos desejos, e fazemos desse objeto um ídolo. Em Ezequiel 14.3, aprendemos que escolhemos criar ídolos no nosso coração, e que eles nos levam a cair em pecado. Nosso coração está adorando ídolos quando produzimos os frutos da carne, pois “de dentro, do coração das pessoas, é que procedem os maus pensamentos, as imoralidades sexuais, os furtos, os homicídios, os adultérios, a avareza, as maldades, o engano, a libertinagem, a inveja, a blasfêmia, o orgulho, a falta de juízo“ (Mc 7.21, 22). Nessas circunstancias nós queremos satisfazer mais os nossos desejos do que os desejos do Espírito.

O perigo dos nossos desejos desmedidos
A Bíblia nos avisa que devemos fugir da idolatria (1Co 10.14). A adoração de ídolos destrói a comunhão que temos com Deus. Nós nos tornamos como os nossos ídolos ao assumirmos a sua imagem e esquecermos de nossa identidade em Jesus. Corremos atrás dos nossos ídolos achando que eles irão nos satisfazer. Nós nos esforçamos em servir os nossos ídolos para que eles nos deem aquilo que desejamos.

A dura realidade é que os nossos ídolos falham conosco. Eles nos cegam ao pecado. Ficamos desapontados e frustrados, e entramos em desespero. Quando as coisas não resultam conforme planejamos, nós nos sentimos atados e não conseguimos levar em frente nossos planos de vida. Nós nos surpreendemos mentindo, manipulando, cobiçando, tornando-nos ciumentos e irados, e tentando desesperadamente mudar nossas circunstâncias. Nós culpamos a Deus por não solucionar nossos problemas, mas Ele parece estar tão distante que não podemos ouvir Sua voz, calma e serena. Nós nos tornamos espiritualmente limitados e vazios. Nossos ídolos bloqueiam nosso prazer no amor de Deus e Seu perdão.

Esperança em Cristo
Nós fomos criados como seres espirituais com um desejo de nos conectar espiritualmente a Deus por meio da adoração. Adoração é o ato de se curvar e mostrar total submissão ao Senhor. Nosso coração é o trono onde muitos deuses competem para reinar com supremacia. Queremos aquilo que os adoradores dos ídolos antigos queriam: riqueza, segurança e poder. Nós podemos não nos curvar diante de estátuas feitas por homens, mas idolatramos no nosso coração carreiras, relacionamentos, posições, posses, entretenimento, educação, sucesso e fama.

As más notícias
Todos nós somos culpados de idolatria. Nosso coração idólatra quebra o mandamento de Deus: “Não tenha outros deuses diante de mim. (Êx 20.03). Deus condena a idolatria porque ela perverte nosso relacionamento com Ele. As Escrituras advertem aos idólatras que Deus chama todos ao arrependimento pois chegará um dia em que Ele irá julgar o mundo em justiça por meio de Jesus Cristo (At 17.30, 31). Deus ordena que nos arrependamos dos ídolos para que Ele seja o único a ocupar o trono do nosso coração.

A boas notícias
Os ídolos do nosso coração não nos dominam quando acreditamos no evangelho de Jesus Cristo para nos salvar dos nossos pecados, e vivemos diariamente o evangelho. Jesus Cristo, como totalmente homem e totalmente Deus, viveu uma vida sem pecado, foi crucificado para suportar a ira de Deus no lugar daqueles que viriam a crer, ressuscitou da sepultura e agora está assentado num trono celestial ao lado da mão direita do Pai em poder e majestade. Nós oramos em nome de Jesus porque Ele é o nosso intercessor, mediador e redentor. Por meio do Seu sacrifício e ressurreição, recebemos o privilégio de entrar em um relacionamento com Deus pela eternidade. O evangelho expulsa os ídolos do nosso coração.

Por termos sido crucificados com Cristo, nossa vida não pertence mais a nós (Gl 2.20). Nossa união íntima com Cristo permite-nos viver em adoração a Deus, em vez de nos curvarmos aos ídolos.

Perguntas para refletir
O que ou quem você deseja mais do que Deus?
Como o evangelho permite que você substitua os desejos desmedidos por desejos centrados em Deus?


[1] PIPER, John. Quando eu não desejo Deus: o que fazer quando não nos alegramos nele. São Paulo: Cultura Cristã, 2018.


Shannon Kay McCoy atua como conselheira bíblica em Valley Center Community Church, no sul da Califórnia. Ela completou o mestrado em aconselhamento bíblico em em The Master’s University em Santa Clarita, Califórnia, e é certificada pela ACBC. É autora do Help! I’m A Slave To Food e contribuiu no livro Mulheres Aconselhando Mulheres.


Original: The Danger of Inordinate Desires
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition
Tradução: Patrick D. Amorim
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico
Usado com permissão.