Filhos pródigos: A dor silenciosa e a vergonha secreta

Paul Tautges

Esteja você ciente disso ou não, há uma dor silenciosa e uma vergonha secreta em sua igreja. Saudações animadas são trocadas a cada manhã de domingo. O “Como vai?” é educadamente retribuído com um “Tudo bem!” ou com o mais ousado “Já estive melhor!”, esperando que quem perguntou pare por ali. Entretanto, por trás de algumas dessas respostas no formato “tudo bem” estão corações esmagados e prestes a se partir devido à dor e à vergonha avassaladoras. A causa de ambas são os filhos pródigos.

É triste, mas é verdade que os pais de filhos pródigos costumam sofrer sozinhos. Pense nisso. Que pai cristão quer anunciar o afastamento temporário de seu filho ou filha de uma vida de temor a Deus ou uma renúncia definitiva da fé cristã? Nenhum. Todo pai sincero, que ama profundamente seu filho, não quer fazer nada que possa dificultar o retorno humilde de seu filho pródigo ao aprisco de Deus. Assim, os pais carregam sozinhos o fardo de sua dor.

Adicione ainda mais peso quando o pai é também líder na igreja. A pressão crescente de viver em um aquário pode levar alguns ao desfalecimento, enquanto viver uma agonia silenciosa pode parecer uma opção melhor e mais segura.

Como podemos ajudar esses pais? Precisamos quebrar o silêncio em nossas igrejas e, como uma comunidade amorosa, cercar os pais feridos e ministrar a esperança do evangelho aos corações oprimidos pela vergonha.

Quebre o silêncio por meio da vulnerabilidade, da comunhão amorosa entre crentes e da oração
O apóstolo João confessa que não tem maior alegria do que ouvir que seus filhos andam na verdade  (cf. 3Jo 4). Entretanto, o oposto também é verdadeiro. Embora o contexto desse versículo diga respeito aos filhos espirituais na igreja, os pais cristãos sabem que não há tristeza maior do que saber que seus filhos estão brincando com o pecado ou que já se afastaram de Cristo de forma decisiva. Misturado à tristeza, está o medo das consequências que seus filhos sofrerão por causa das escolhas pecaminosas. Esses pais precisam de outras pessoas para ajudá-los a carregar seu fardo pesado. Isso requer por parte deles um certo grau de vulnerabilidade, fruto da humildade que Deus deseja desenvolver em cada um de nós.

Devemos nos lembrar da conexão entre nossa humildade e a capacitação de Deus. A Bíblia ensina consistentemente que Deus dá mais e mais graça aos humildes (cf. Pv 3.34; Fp 2. 5-9; 1Pe 5.5, 6; Tg 4, 6). No entanto, expressar essa postura de coração pode ser particularmente difícil para os pais de filhos pródigos. A ajuda bondosa de um conselheiro ou do pastor da igreja pode ser necessária para encorajar o pai ferido a confiar em mais um ou dois crentes fieis ​​e espiritualmente maduros para acompanhá-los. Eles precisam ser expostos a exemplos bíblicos de vulnerabilidade, lembrando-os de que a graça de Deus os fortalece na fraqueza (cf. Rm 7.23, 24; 2Co 2.3, 4; 4.7; 11.27-30; 12.9, 10 ; 13. 4; Tg 5.16).

A vulnerabilidade humilde pavimenta o caminho para o desenvolvimento de uma comunhão amorosa com outros crentes e a devoção à oração (cf. Cl 4.2). Juntos devemos aprender a nos alegrar na esperança, ser pacientes na tribulação e perseverantes na oração (cf. Rm 12.12). A igreja atua como um corpo em sua plenitude quando os membros se revestem de humildade, o que abre a porta para a amabilidade e as expressões de compaixão (cf. Cl 3.12).

Nos últimos cinco anos, uma comunidade amorosa começou a cercar alguns dos pais feridos em nossa igreja. Estendemos a mão para eles, e algumas mães se reúne semanalmente para orar pelos filhos pródigos da igreja. Às vezes, tudo o que é necessário para quebrar o silêncio é um dos pais estar disposto a abrir humildemente uma janela para sua dor, compartilhando seu fardo.

Ministre a verdade do evangelho à vergonha secreta
Frequentemente, os pais de filhos pródigos sofrem em silêncio porque se sentem envergonhados. Eles costumam se sentir um fracasso e acreditam que a rebelião de seus filhos deve, de alguma forma, ser sua culpa. Embora seja verdade que a falta de uma vida cristã autêntica – uma caminhada que não corresponde ao que se diz – afeta aqueles ao nosso redor, de forma alguma isso significa que os pais devam carregar a culpa das escolhas tolas de seu filho pródigo (cf. Ez 18.20). Os pais cristãos autênticos devem buscar humildemente ao Senhor para aprender como eles podem crescer no processo de santificação. No entanto, ao fazer isso, eles devem proteger cuidadosamente o coração contra o poder paralisante da introspecção mórbida, que analisa excessivamente as ações passadas. Em vez disso, eles precisam redirecionar a mente para Cristo e a esperança do evangelho (cf. Cl 3.1-4).

Os pais dos filhos pródigos precisam beber da fonte da graça do evangelho, uma vez que muitas vezes eles têm um senso real ou percebido de que são objeto do julgamento tácito de outros que insinuam que eles, pelo menos parcialmente, são culpados pela dureza de coração de seus filhos. Isso é particularmente verdadeiro para aqueles que foram ensinados a seguir um modelo padronizado de criação de filhos.

Algumas igrejas deixam de perceber que  um ensino impreciso do livro de Provérbios, apresentando-o como se fosse uma coleção de fórmulas e não de princípios gerais e observações sobre a vida, cria involuntariamente uma cultura de vergonha autoimposta. Por exemplo, Provérbios 22. 6 diz:  “Ensine a criança no caminho em que deve andar, e ainda quando for velho não se desviará dele”. Quando esse versículo é apresentado como uma fórmula garantida – isto é, se os pais fizerem a + b, isso sempre levará a c – esse ensino coloca os pais cristãos em um estado de desânimo porque eles não conseguem entender a razão por que alguns de seus filhos amam e servem a Cristo, enquanto outros não mostram nenhum interesse espiritual. Enquanto criavam seus filhos, eles acreditavam – embora nunca o  verbalizassem – que se educassem seus filhos nos caminhos do Senhor, então cada um de seus filhos nunca se afastaria da fé cristã. Isso, simplesmente, nem sempre é verdade. Apesar das diversas interpretações do significado desse versículo, todos os intérpretes bíblicos mais confiáveis ​​concordam que Provérbios 22.6 é uma observação de um princípio de vida, não uma promessa infalível de que a criação dos filhos nos caminhos de Deus sempre resulta em “sucesso” para os pais.

Os pais cristãos precisam ser lembrados de que a graça soberana de Deus é maior do que o seu pecado ou o pecado de seus filhos (cf. Rm 5.20) e que cada conversão a Cristo é singular. O Espírito Santo é quem regenera os pecadores mortos e cria a fé salvadora (Jo 3.5-8; Ef 2.8-10; Tt 3.5; 2Co 5.17). Isso pode significar que alguns filhos criados em um lar cristão passarão por um período de peregrinação nos caminhos da obstinação e nos prazeres do pecado antes que o Espírito Santo os leve ao arrependimento e fé genuínos. Os pais não são responsáveis para carregar o peso da salvação de seus filhos, pois esse é um peso que só Deus é forte o suficiente para carregar.

O Senhor não abandona os pais de filhos pródigos para que andem sozinhos por um caminho doloroso. O Espírito Santo está agindo no coração dos filhos, bem como no dos pais, ensinando-os a entregar mais humildemente seus filhos ao Senhor. Os pais precisam sentir que é seguro apoiar-se na comunidade da igreja, pois o problema não é apenas deles, mas do corpo de Cristo. Deus está trabalhando todas as coisas para Sua glória e o bem de Seu povo. Vamos encorajar os pais com essas verdades!

Perguntas para refletir
Para os líderes e conselheiros: Como o Senhor deseja usar a experiência dolorosa dos pais de filhos pródigos para cultivar humildade e uma comunidade amorosa em sua igreja?

Para os pais: Leia a parábola do filho pródigo em Lucas 15. 11-32. Peça que Deus exponha qualquer “orgulho do irmão mais velho” que você precise confessar e mantenha seu coração de pai terno e pronto para o retorno de seu filho pródigo.


Paul Tautges está envolvido no ministério há 30 anos e serve como um dos pastores da Cornerstone Community Church em Cleveland, Ohio. Já escreveu ou editou mais de 60 livros, incluindo Meu filho pequeno governa a casa, publicado pela Editora Peregrino. Paul Tautges escreve regularmente em seu blog Counselin One Anoter www.counselingoneanother.com.



Original: The Silent Pain and Secret Shame in Our Churches
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition
Tradução: Carla Silva
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico
Usado com permissão.