Joe Keller
Um dos momentos mais cruciais, e mais comuns, com os quais me deparo ao aconselhar pessoas que estão lidando com a antecipação de uma conversa difícil é ajudá-las a “querer” ter tal conversa. Claro, posso ser empático – você teria que ser masoquista para sentir prazer diante da possibilidade de uma conversa desconfortável. É comum que as conversas difíceis movam-se de momentos embaraçosos a confrontações não muito bem aceitas. No entanto, existe um momento crucial que devemos superar, tomando a decisão de ir adiante em algo desagradável, mas com amor genuíno. Vamos considerar alguns dos motivos convincentes e considerações práticas para ter uma conversa difícil.
POR QUE TER UMA CONVERSA DIFÍCIL?
1- Temos responsabilidade uns para com os outros (1Coríntios 12.16; Hebreus 3.12-14)
Uma motivação fundamental para ter uma conversa difícil é a preocupação sincera com o bem-estar de nossos irmãos em Cristo. O fato de pertencermos juntos a Cristo obriga-nos, como expressão de amor, a ir ao encontro daqueles que precisam de ajuda para discernir seu coração e comportamento, ou receber cuidado. Esses momentos nem sempre são bem-vindos ou fáceis. A diferença entre imaturidade e imoralidade pode ser difícil de discernir quando procuramos entender as pessoas e seus problemas. A motivação para ir em direção ao outro tem base no fato de sermos família em Cristo, o que vai além da amizade e do coleguismo. Pertencer à família de Deus, na qual somos interdependentes num relacionamento de mão dupla, é a bênção de sermos redimidos em Cristo.
2- Temos capacidade para viver na verdade (Colossenses 3.1-4, 16, 17; Rm 12. 1-3)
Uma característica decisiva da obra de transformação do evangelho é nossa habilidade para viver na verdade. Nosso coração é propensos ao engano por causa do pecado, mas a renovação da nossa mente, de acordo com a Palavra e o Espírito, traz a capacidade de entender e viver na verdade. O evangelho abre uma nova perspectiva e o caminho de esperança eterna. Viver a verdade do evangelho aplicada à realidade da experiência humana não remove as duras realidades da vida. Ainda assim, ela dá de forma categórica e prática a perspectiva e os meios para viver corretamente com confiança e esperança. Ter uma conversa difícil não é simplesmente abordar os problemas, mas dar esperança e ajuda para viver corretamente na verdade.
3- Temos um chamado para ser testemunhas do Evangelho (1João 4.11, 12; João 13.35)
Nossa maneira de viver é importante. A verdade das Escrituras ficam visíveis não apenas nas páginas da Palavra de Deus, mas também nas nossas ações. Aceitar o desafio de procurar uns aos outros para conversas difíceis, que têm por propósito um incentivo a viver corretamente diante de Deus e dos outros, é contracultural. Quando a igreja mostra unidade em Cristo dentro de uma imensa diversidade de culturas, personalidades e experiências de vida, ela proclama a obra transformadora da nossa reconciliação com Deus e uns com os outros. Aproximarmo-nos uns dos outros para conversas difíceis deve ser motivado pelo testemunho do evangelho. O argumento mais comum contra a verdade do Cristianismo não é polêmico, mas ético. A maneira de viver do povo Deus, e de cuidar uns dos outros, é motivada pelo evangelho e proclama a verdade do evangelho que transforma os corações.
4- Temos a oportunidade de incentivar mudança (2Coríntios 3.18; Colossenses 1.28, 29)
O papel das conversas, fáceis ou difíceis, é essencial no processo contínuo de santificação na vida de um crente. Reconhecer que os problemas ou desafios provavelmente não irão embora por si mesmos traz um grau de compaixão e persuasão à conversa difícil. A conversa é uma oportunidade para se fazer uma pergunta que não havia sido considerada antes ou convidar a ver algo que não havia sido identificado anteriormente. A beleza de uma conversa desafiadora ou de um feedback se mostra quando ela promove novas maneiras de entender. Ajudamos uns aos outros a ver coisas que não podíamos ver sozinhos. Quando essa realidade está associada à verdade bíblica, ela reformula a perspectiva e é transformadora por meio da obra do Espírito Santo que nos une. Todos nós precisamos da graça de Deus e estamos caminhando no processo de mudança. Aqueles que dão testemunho dos bons resultados de mudança por meio de conversas difíceis nunca falam que os resultados são apenas unilaterais.
COMO TER UMA CONVERSA DIFÍCIL?
1- Seja claro em suas observações (1Ts 5.14; Gl 6.1-5)
Muitas vezes, você pode sentir que algo não está certo e que está causando prejuízos à pessoa e a outros ao seu redor. No entanto, nem tudo está claro para você, e você ainda não consegue articular o problema de maneira objetiva e específica. Esperar em espírito de oração e pedir clareza ao Senhor é o ponto fundamental para poder comunicar com objetividade e conduzir a pessoa à compreensão do problema. Essa clareza é importante para determinar o tipo de conversa que você precisa ter. Essa conversa diz respeito a uma questão de pecado ou de imaturidade? Aspectos como preferências pessoais ou hábitos cultural estão envolvidos?
2- Seja motivado pelo amor (Cl 3.12-15; Rm 12.9-21)
Se você estiver motivado apenas pelo dever de ter essa conversa, é possível que acabe se perdendo no mundo das conversas difíceis. A comunicação pode ser percebida como dura, pode haver incompreensões e pode parecer que está preocupado mais com o conteúdo da conversa do que com a pessoa. As conversas difíceis visam a compreensão e a abertura de caminhos que conduzam a um estilo de vida de adoração a Deus. A sua disposição para investir em conversas difíceis é sustentada pelo amor que se torna visível, que exclui as suas segundas intenções e vantagens pessoais.
3- Seja intencional na escolha do momento e do lugar (Pv 25.11; Ef 4.29)
Se há algo que aprendi ao longo dos anos de ministério de aconselhamento, é que o momento e o contexto de uma conversa são importantes. Devemos escolher um momento e um lugar que permita a ambos os lados envolvidos ouvir e entender. Precisamos considerar o intervalo de tempo adequado para que aconteça a recepção e o processamento das informações, reconhecendo que a(s) outra(s) pessoa(s) podem não estar preparadas para essa conversa da mesma forma que você. A escolha cuidadosa de um contexto que facilite a compreensão pode ser tão importante quanto o próprio conteúdo da conversa.
4- Seja fiel (Gl 5.22; Pv 20.6)
Pegue o telefone, bata à porta, envie uma mensagem ou dê um “oi” no corredor. Somos chamados a ser fiéis em tomar a iniciativa de ter uma conversa e permitir que a Palavra de Deus, aplicada pelo Espírito Santo, guie os resultados. Uma conversa difícil e bem-sucedida é resultado da fidelidade em tomar a iniciativa e renunciar à responsabilidade de forçar a outra pessoa a um quebrantamento que somente nosso Redentor é capaz de promover. Muitos desistirão de ter uma conversa difícil porque não conseguem ver lucro no desafio que elas representam nem entrever a concretização dos resultados desejados. Seja também fiel em voltar a ter as conversas como de costume em seguida da conversa difícil. Isso comunica que o relacionamento pode desfrutar de todo o espectro de conversas.
As conversas difíceis não são fáceis e certamente necessitam ser cuidadosamente pensadas para serem significativas e eficazes. Compreender a arte e a prática de ter conversas difíceis começa com o compromisso de não evitá-las e a motivação certa para tê-las. Portanto, da próxima vez que o desafio de uma conversa potencialmente desafiadora se apresentar, considere esses princípios para servir e adorar a Deus, mesmo nas coisas difíceis.
Perguntas para reflexão
1- Que outros lembretes da Palavra de Deus o ajudam quando deve se aproximar de outras pessoas para ter um conversa potencialmente difícil?
2- Você consegue lembrar de uma conversa difícil que correu bem?
3- Você consegue lembrar de uma conversa difícil que não correu bem? O que você poderia ter feito de outra maneira para se preparar para aquele momento?
Joe Keller dedica-se há mais de vinte anos para promover uma educação distintamente bíblica. Atualmente, é diretor da Grace Brethren Schools em Simi Valley, Califórnia e leciona no Departamento de Aconselhamento Bíblico em The Master’s University. Ele se formou em The Master’s University, é mestre em divindade pelo The Master’s Seminary e doutor em ministério pelo Westminster Theological Seminary.
Original: Having the Hard Conversation
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition
Tradução: Carla Siva
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico
Usado com permissão.