O que fazer diante de um diagnóstico

Howard Eyrich

Após investir alguns minutos para construir envolvimento, eu disse a Carlos: “Percebi nas informações que você recebeu um diagnóstico de transtorno bipolar. Você pode me dizer de quem recebeu este diagnóstico e quando isso aconteceu?”

Com um sorriso encabulado, Carlos respondeu: “Bem, vamos dizer que foi Dr. Google”. Este está se tornando um fenômeno frequente. Outra resposta poderia ser: “Ah, fiz um teste online e ele mostrou que sou bipolar”[1]. Um recurso também usado para autodiagnóstico, e que parece muito confiável pelo nome que leva, é o site da clínica Mayo.[2] Uma expressão de busca no Google como, por exemplo, “Quais são os sinais e sintomas do transtorno bipolar” o levará a vários sites para autodiagnóstico. Independentemente da fonte, não se surpreenda com o incentivo à automedicação com tratamentos naturais que pode acompanhar o autodiagnóstico.

Claro que Carlos poderia também ter respondido que o Dr. João Silva ou o seu psiquiatra, o Dr. Pedro Santos,  eram responsáveis pelo diagnóstico.[3] 

O preparo necessário

Independentemente da resposta, o conselheiro bíblico, por várias razões, precisa estar familiarizado com a linguagem que o aconselhado traz para o encontro de aconselhamento.

Em primeiro lugar, você encontrará aconselhados que já chegam com um “rótulo”. É bom que você saiba o que ele significa em termos de diagnóstico e conheça as principais abordagens de tratamento utilizadas no aconselhamento secular. Em segundo lugar, como conselheiro bíblico, você opera numa comunidade que, juntamente com seus aconselhados, espera que você seja capaz de discutir essas questões usando uma terminologia de entendimento comum. Se você não for capaz de cumprir o que acabamos de dizer, você ficará envergonhado e envergonhará o seu Senhor, pois, em outras palavras, você precisa estar pronto para ser um bom apologeta do aconselhamento bíblico.

Opções possíveis para responder aos diagnósticos

Pressupondo que você seja um conselheiro bíblico conhecedor da classificação do DSM, quais são as opções disponíveis para responder a alguém como Carlos? Parece-me que poderiam ser três:

  1. ignorar o diagnóstico;
  2. lidar com as emoções, pensamentos e comportamentos apresentados pelo aconselhado fazendo exortações com o uso de textos bíblicos;
  3. tirar o DSM-5 da sua estante[4], listar os sintomas incluídos nos critérios de diagnóstico (talvez imprimi-los para o aconselhado ler) e explicar que a Bíblia não tem essa categoria de diagnóstico, mas que ela trata desses vários sintomas.

Em seguida, você daria esperança dizendo que “veremos juntos como Deus lida com esses sintomas” e explicaria como pode ajudar Carlos (ou Susana) a aprender a implementar as estratégias bíblicas para abordar os sintomas, renovar sua mente e desenvolver um novo conjunto de hábitos de vida. Além disso, você explicaria que o Espírito Santo capacitará o aconselhado para que Cristo seja glorificado em sua vida e a alegria do Senhor seja vivenciada.[5]

Um conselheiro bíblico responsável certamente não escolheria a primeira opção. Fazer isso seria desconsiderar a forma de pensar do aconselhado, ver os sintomas emocionais como o problema e, na melhor das hipóteses, talvez também o problema de comportamento que os acompanha. Escolher esta opção só trataria o que Jay Adams chamou de “problema de apresentação” (ou o que chamo de “problema apresentado”  em Curing the Heart ).

Um ponto de vista: a melhor opção e por que eu a escolhi

A melhor opção, a meu ver, é uma combinação das opções dois e três. Dedicar tempo para avaliar os esforços que o aconselhado investiu na tentativa de lidar sozinho com o problema, por meio de sua busca na internet, ou procurando ajuda na comunidade secular é um primeiro passo para construir relacionamento e poder dar esperança. Acompanhar o aconselhado cuidadosamente na leitura da sintomatologia listada no DSM-5 ajuda você a obter rapidamente uma visão mais ampla do que o aconselhado está vivenciando. Também demonstra ao aconselhado que você não ignora o modelo médico secular, de modo que, quando você começar a apresentar o tratamento bíblico, terá um grau mais elevado de credibilidade – você não é simplesmente alguém que bate a Bíblia na cabeça do aconselhado nem que distribui curativos Band-Aid de versículos bíblicos.

Além disso, e mais importante, você começará a levantar dados sobre a vida do aconselhado – família, estudo, trabalho, colegas, crises etc. —que influenciaram sua forma de pensar, sentir e se comportar. Em outras palavras, você vai descobrir as influências e também a forma de pensar conscientemente escolhida pelo aconselhado em seu coração.[6]  Sim, pode haver e provavelmente há problemas de estilo de vida que estão dando origem ao desenvolvimento da sintomatologia bipolar. Um histórico cuidadoso do comportamento trará à tona essas questões.

O processo de aconselhamento                                                          

Com seu treinamento em aconselhamento bíblico, e tendo em mãos os dados coletados e uma identificação razoável dos problemas, o conselheiro está pronto para iniciar o processo de aconselhamento bíblico orientando o aconselhado a repensar a vida em termos bíblicos. A coleta de dados orienta a confrontação e gera esperança em Deus para a jornada de mudança. A esperança torna-se a base para um compromisso de se engajar em atividades práticas para a mudança. Essa cooperação com o Espírito Santo produz a transformação que é chamada de santificação progressiva.

Alguns conselheiros podem se opor a fazer referência  ao DSM-5. No entanto, a intenção aqui não é recomendar qualquer forma de integração da Bíblia com o modelo secular. Nossos colegas seculares, embora interpretem os dados de maneira diferente, sem a sabedoria bíblica, fazem um bom trabalho na coleta de dados epidemiológicos. Assim, eles processam e analisam e agrupam as ocorrências, avaliam a frequência de pensamentos e comportamentos, dando origem a esses diagnósticos que, muitas vezes, os aconselhados atribuem a si mesmos.

Uma conclusão prática                                                                                  

Mostramos aqui como responder ao aconselhado que se apresenta a você com um diagnóstico que ele atribuiu a si mesmo ou lhe foi dado por um profissional. A abordagem apresentada serve como uma ponte entre a identificação dada pelo aconselhado por meio do rótulo psiquiátrico “Eu sou bipolar” e a identificação como “Eu sou um filho de Deus habitado pelo Espírito Santo que está lutando com sintomas de bipolaridade”. Essa abordagem pode dar ao aconselhado uma compreensão prática dos sintomas envolvidos no diagnóstico e, ao mesmo tempo, fornecer pontos de entrada para o conselheiro introduzir os recursos das Escrituras que são suficientes na resolução de sintomas —  muitas vezes estaremos diante de uma série de hábitos pecaminosos – e dos problemas do coração do aconselhado por trás dos sintomas e comportamentos. Este processo resulta em alívio para o aconselhado e na glória de Deus, o fim principal do homem.[7] 

Perguntas para reflexão

1- Com quais diagnósticos psiquiátricos você já se deparou? Em espírito de oração, considere e pesquise como você lidará agora com esse tipo de situação e escreva seu plano.

2- Como você responderá ao aconselhado diagnosticado que lhe fizer a seguinte pergunta: “Como um conselheiro pode me ajudar com ____ (preencha com o diagnóstico) usando a Bíblia quando ____ (preencha com o diagnóstico) nem mesmo era conhecido quando a Bíblia foi escrita?


[1] https://heywise.com/quiz/do-you-think-you-have-bipolar-disorder/

[2] Mayo Clinic é uma organização sem fins lucrativos da área de serviços médicos e de pesquisas médico-hospitalares. Tem sido considerado um dos melhores hospitais do Estados Unidos. Mantém site em português: https://www.mayoclinic.org/portugues

[3] Todos os nomes são fictícios.

[4] NdT. Conselheiros que não possuem o DSM-5 podem pesquisar via internet.

[5] Evidentemente, o conselheiro bíblico daria ao aconselhado as referências bíblicas apropriadas que são base para essas afirmações.

[6] Howard Eyrich e William Hines, Curing the heart.  (Christian Focus Publications, Ltd., 2002), 185.

[7] Primeira pergunta da Confissão de Fé de Westminster


Howard Eyrich é pastor aposentado e professor de aconselhamento bíblico. Ele exerce seu ministério em sua igreja local e no Owen Center de Auburn, Alabama. Também promove seminários em igrejas sobre Casamento e Família, Treinamento de Conselheiros Bíblicos e Envelhecimento de uma Perspectiva Bíblica. 


Original: What to Do with a Diagnosis
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition.  Traduzido com autorização.

Tradução e adaptação para o português por Conexão Conselho Bíblico