Pamela Gannon
Quando aconselho pessoas que sofreram um abuso sexual, muitas vezes elas me pedem para explicar o caráter e a maneira de agir de Deus. Às vezes, há uma indagação que pode ser motivada por uma ira desafiadora. Com mais frequência, porém, as perguntas brotam de corações confusos e temerosos.
Talvez você já tenha ouvido essas ou outras perguntas parecidas:
- Por que Deus permitiu isso?
- Ele estava lá?
- Ele se importava com o que estava acontecendo? Ele se importa agora?
- Se Ele viu e odeia, por que não impediu, já que Ele tem todo o poder?
- Por que Ele permitiria tal maldade se Ele é bom?
Como podemos nos aproximar com amor de alguém que está expressando essas dúvidas e falar a verdade sobre questões tão difíceis? Vou compartilhar uma abordagem em quatro pontos que descobri ser útil.
1- Discernir em oração a atitude do coração
Somos exortados em 1Tessalonicenses a admoestar os insubmissos, consolar os desanimados, amparar os fracos e ser pacientes com todos (1Ts 5.14 – ARA). Para responder sabiamente às lutas de um aconselhado, precisamos identificar se estamos lidando com perguntas de um coração basicamente insubmisso, desanimado ou fraco.
Insubmisso: A pessoa está fazendo perguntas sobre Deus de maneira rebelde e contenciosa? Quando recebe instrução, ela fica irada, argumenta ou acusa Deus de estar errado? Se for este o caso, devemos adverti-la amorosamente a respeito de sua situação perigosa, pois ela está resistindo ativamente a Deus, expressando seu orgulho (Tg 4.6). Nunca é certo ficar irado contra de Deus ou acusá-lo de fazer algo errado. Se estivermos lidando com um coração insubmisso a Deus, o chamado ao arrependimento é adequado. A pessoa está se distanciando da única fonte de esperança verdadeira!
Desanimado: A pessoa está fazendo perguntas sobre Deus com um coração que teme novos sofrimentos? Um coração que teme a possibilidade de que o abuso possa acontecer novamente precisa ouvir sobre a certeza de que Deus a ama genuinamente. Essa pessoa precisa de coragem — o encorajamento que vem de saber que o Senhor, que está sempre presente e cuida dela pessoalmente e por toda a eternidade, está no controle e operando todas as coisas para Sua glória e nosso bem.
Fraco: A pessoa está fazendo perguntas sobre Deus com o coração cheio de dúvidas? A sua fé é fraca e ela está oprimida pela culpa, sentindo-se responsável pelo abuso ou facilmente caindo em pecados em resposta à terrível experiência que viveu? Nesse caso, devemos auxiliá-la, ficando ao seu lado para dar apoio, proporcionando estrutura, prestação de contas e habilidades práticas baseadas em ensinos bíblicos para ajudá-la a se despojar do velho homem e se revestir do novo homem em desejos, pensamentos e comportamentos.
Uma vez que procuramos cuidadosamente coletar dados e discernir a atitude do coração, temos a direção inicial para a nossa abordagem de aconselhamento. Este é o momento para encorajarmos pacientemente a pessoa a se comprometer com Deus para que ela possa provar e ver que “o SENHOR é bom; bem-aventurado é quem nele se refugia” (Sl 34.8). Ajude a pessoa a ver como a Palavra de Deus dá sabedoria para lidar com seus problemas. Comece por falar sobre aquilo que sabemos.
2- Mostrar o que sabemos
Sabemos que Deus é bom, soberano, sábio, santo e perfeito em todos os Seus caminhos (Sl 145.17; 1Pe 1.16). Ele nunca é o autor do mal. Gênesis 3 revela que foi só quando o homem escolheu o caminho de Satanás, em vez do caminho de Deus, que o mal e o sofrimento entraram no mundo. Portanto, o sofrimento vem do pecado do homem. Deus não é cruel. O sofrimento e a tristeza que enfrentamos hoje são a consequência do pecado neste mundo caído, do pecado de outras pessoas e do nosso próprio pecado. O pecado trouxe destruição e sofrimento, e nós sabemos disso.
Quando estamos confusos ou zangados com o que sofremos, devemos lembrar que por trás do sofrimento está o pecado que entrou neste mundo. Na verdade, o sofrimento, visto corretamente, dá-nos um vislumbre de quão mal o pecado realmente é, e do porquê nosso Deus perfeito o odeia. O mal é completamente contrário à natureza de Deus. No entanto, Deus usa até mesmo algo tão terrível como o pecado e o sofrimento para o nosso bem e para a Sua glória[1] (Rm 8.28, 29). Nós sabemos disso.
No entanto, há muitas coisas que não sabemos. Em seguida, portanto, mostre que não há problema em não saber dar respostas precisas para as perguntas “por quê?”. Deus não exige que entendamos coisas que Ele não nos revelou.
3- Mostrar que não há problema em não saber
Temos uma compreensão geral do sofrimento neste mundo, mas fora isso não podemos saber exatamente por que Deus permite cada situação. Existem “coisas encobertas” – coisas que Deus não nos revelou – e elas pertencem somente a Deus (Dt 29.29). Muitas vezes, queremos saber essas “coisas encobertas”; queremos saber exatamente por que Deus permitiu um abuso. No entanto, considere a analogia a seguir.
Suponha que nos deparamos com um grande formigueiro. Se eu traçasse uma linha cortando o caminho de uma formiga ou remexesse a terra, a formiga não teria ideia do que aconteceu; ela simplesmente começaria a correr ao redor “agindo como formiga” para resolver a situação. Ela nem mesmo se daria conta de minha intervenção. Ela não pode compreender minha existência. Agora suponha que eu queira explicar minha existência para a formiga. Suponha que eu queira explicar computadores, viagens aéreas e estrelas. Eu não posso explicar essas coisas para uma formiga. Por que não? Porque ela tem um cérebro de formiga. Uma formiga é incapaz de me entender e de compreender o meu universo. Se eu pudesse me tornar uma formiga, talvez eu conseguisse explicar algumas coisas em seu método de comunicação, mas eu sempre estaria limitado no que poderia lhe dizer por causa de sua capacidade imperfeita de conhecimento. Não há problema nisso! A formiga sabe tudo o que precisa saber para viver adequadamente como formiga.
De maneira semelhante, somos criaturas com cérebro humano, portanto não podemos entender todos os caminhos de Deus. Seus caminhos vão muito além do que podemos compreender. No entanto, o que Deus nos revelou é suficiente para nos capacitar para viver bem e viver para a Sua glória (2Pe 1.3ss). Finalmente, então, resuma tudo explicando aquilo que sabemos.
4- Mostrar que aquilo que sabemos é suficiente
A Bíblia nos diz:
- Nossa mente finita não foi feita para entender completamente os mistérios dos caminhos do Deus no universo (Is 55.8, 9; Rm 11.33).
- A intenção precisa de Deus ao permitir certas situações nem sempre ficará aparente para nós (Jó).
- Nossa alma deve estar ancorada no que as Escrituras revelam claramente sobre o caráter e a ação de Deus (Is 26.3).
- A humildade aceita o fato de que convivemos com perguntas sem resposta (Is 45.9).
- Deus nos revelou tudo o que precisamos saber (2Pe 1.3, 4).
O uso dessa abordagem ajuda os aconselhados a lidar com questões que muitas vezes surgem diante do mal praticado contra eles por outras pessoas.
Pergunta para Reflexão
Como você tem lidado nos aconselhamentos com questões difíceis que suscitam a pergunta “Por quê?”
[1] JONES, Robert. When hardships hit: 7 ways God uses suffering to make us like Jesus. Kansas City, MO: Association of Biblical Counselors, 2016. Disponível em https://biblicalcounseling.com/product/hardships-hit-7-ways-god-uses-suffering-make-us-like-jesus.
Pamela Gannon, é graduada em enfermagem e mestre em aconselhamento bíblico. Ela tem ministrado como conselheira bíblica na Grace Bible Church em Bozeman e como professora no Montana Bible College desde 2011. Ela e seu marido ensinam em eventos de treinamento da Association of Certified Biblical Counselors (ACBC).
Original do artigo: Compassionate Answers to “Why?” Questions
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition. Traduzido com autorização.
Tradução e adaptação para o português por Conexão Conselho Bíblico