Em 10 Cross-Focused Principles Versus Horizontal Strategies for Dealing with Anger, Tim Allchin destaca algumas das estratégias que costumam ser indicadas quando o desafio é lidar com a ira, e contrasta cada uma delas com a perspectiva bíblica. Seu propósito não é sistematizar uma metodologia para tratar a ira, mas provocar uma reflexão diante das propostas seculares. Você já ouviu algum dos conselhos que o mundo ao seu redor oferece? Você já avaliou biblicamente o que está sendo recomendado? A Bíblia reverte o pensamento do homem ao levar o foco para a obra de Cristo na cruz.
A ira é um problema do coração
Ultimamente, tem-se falado mais do que nunca em violência doméstica. Estimulados por casos que tiveram repercussão na mídia, quando atletas e celebridades ultrapassaram os limites cabíveis, assuntos como violência doméstica e controle da ira têm ocupado as conversas como nunca antes. Visto que existem vários pontos de vista a respeito de como restaurar corretamente aqueles que cometem atos de violência quando irados, diferentes estratégias ganham espaço nessas conversas.
Talvez como nunca antes, aqueles que perdem o controle da ira e praticam violência doméstica colhem consequências rápidas por parte da lei e de seus empregadores. As igrejas também têm começado a praticar políticas para lidar com a violência doméstica. Esse é um problema que nós, como conselheiros bíblicos, seremos chamados a tratar.
Embora a violência doméstica seja muito mais complexa que a simples expressão da ira, é incontestável que a violência doméstica envolve a ira descontrolada. Às vezes, essa ira é uma estratégia intencional para intimidar, e outras vezes é o resultado menos intencional de um conflito que explode e escapa do controle. De uma forma ou de outra, a violência doméstica é pecaminosa e destrutiva, e deve ser tratada além do aspecto comportamental e cultural. A ira é a antítese espiritual de quem Deus nos chama a ser (Pv 25.28). A ira é um problema do coração, um transtorno de adoração.
Como podemos ajudar aqueles que estão presos a hábitos de ira destrutiva? Normalmente, a nossa cultura foca em estratégias horizontais para lidar com as emoções por meio do controle do ambiente ou das pessoas ao redor. Embora isso possa ajudar momentaneamente, o mundo falha em perceber a batalha espiritual travada no coração daqueles que se entregam à ira, e assim as mudanças não costumam ser duradouras.
Listamos aqui 10 estratégias comumente usadas por aqueles que procuram ajudar pessoas iradas a lidar com sua agressividade na dimensão horizontal. Trata-se basicamente de estratégias cognitivas-comportamentais. Embora nem todas pareçam de todo ruins, falta-lhes algo. Precisamos olhar para cada uma delas na dimensão vertical, através das lentes da cruz de Cristo, e ver como Cristo traz esperança nas questões relacionadas à ira.
Estratégia n° 1: Gerencie sua ira
Ouvimos dizer: “Concentre-se em aprender o autocontrole nas explosões de ira; conheça melhor a si mesmo. Quando a temperatura estiver subindo, neutralize a situação com um processo mental apropriado”.
A cruz de Cristo lembra-nos que podemos fazer algo melhor que apenas controlar nossas emoções. Podemos obter uma vitória crescente sobre a ira por meio da mudança do coração, aprendendo a deixá-la aos pés da cruz de Cristo, onde depositamos nossa vida em troca da vida de Cristo em nós (Fp 1.21) e permitimos que as Suas emoções reflitam em nós pelo fruto do Espírito (Gl 5.22-26). O domínio próprio é fruto do Espírito e é desenvolvido na dependência de Deus, por meio da prática obediente a Ele. O coração (pensamentos e crenças, desejos e intenções da vontade) dita os comportamentos (certos ou errados) e as emoções (positivas ou negativas). À medida que aprendemos a controlar os pensamentos (2Co 10.5), agindo de forma piedosa independentemente de como a outra pessoa agiu (Rm 12.18-21), somos abençoados com o controle adequado das emoções.
Estratégia n° 2: Disperse sua ira
O ensinamento cognitivo-comportamental diz: “Viaje na fantasia para o seu mundo da felicidade, o Taiti ou Havaí, ou vá para uma cabana no topo de uma montanha remota… escape para lá e você se sentirá menos irritado”.
Em vez de um escape mental, a cruz de Cristo provê um foco para a reflexão que transforma nossa atitude negativa em gratidão. As pessoas gratas não lutam com a ira da mesma maneira que os resmungões críticos, pois seu foco está naquilo que Deus está fazendo, não no que parece dar errado (1Ts 5.18). Deus nos chama a olhar o bem que pode resultar das circunstâncias difíceis (Gn 50.20).
Estratégia n° 3: Redirecione sua ira
O mundo nos diz: “Corra, nade, pratique boxe, escale montanhas – use a energia da ira para realizar grandes coisas. Soque um travesseiro, grite ou sopre bolhas de sabão para se acalmar”.
A cruz de Cristo lembra-nos do amor em nossos esforços de redirecionamento da ira (1Co 10.13, 14). Deus manifesta a Sua ira contra o pecado alcançando em amor os pecadores para os salvar. Devemos usar a energia de nossa ira para corrigir os problemas, como Jesus fez no templo, redirecionando a casa do seu Pai de um covil de ladrões para uma casa de oração novamente. A energia usada de modo destrutivo é pecaminosa, e até mesmo atitudes de neutralidade não tratam os problemas do coração. Só usamos a energia de maneira que honra a Deus quando perguntamos a nós mesmos como podemos resolver os problemas de forma construtiva.
Estratégia n° 4: Evite a ira
Ouvimos dizer: “Certifique-se de eliminar da sua rotina diária aquilo que desencadeia a sua ira. Estabeleça limites e erga paredes para evitar as situações estressantes com pessoas que provocam sua ira”.
A cruz de Cristo obriga-nos a assumir os riscos de amar em vez de evitar a dor (1Co 13.4-7). Cristo não nos deu um modelo de como evitar as pessoas e situações, mas Ele suportou o sofrimento por causa do amor (Hb 12.1, 2). O ato de evitar as pessoas costuma ser motivado pelo temor, e o temor arma ciladas para aqueles que são controlados por ele (Pv 29.25).
Estratégia n° 5: Minimize a ira
O mundo diz: “Respire fundo, conte até 10, as coisas não estarão tão ruins daqui a 30 segundos, uma vez que a adrenalina de sua ira abaixar. Lembre-se das crianças pobres na África, e você perceberá que sua situação não é tão terrível assim. Passe por cima disso”.
A cruz de Cristo demonstra o quão severamente Deus vê o pecado que cometemos e o pecado cometido contra nós. Podemos ficar entristecidos pelo pecado e reconhecer a dor violenta que ele causa, mas vivemos na esperança de que haverá restauração (2Co 7.9-11).
Estratégia n° 6: Redefina a ira
Ouvimos dizer: “Não é ira; chame-a de desabafo, desapontamento, mágoa, frustração, aborrecimento, irritação, e assim por diante. Se a ira for algo errado a seu ver, então não fique irado, mas encontre uma maneira menos intensa de se expressar”.
Por causa da cruz de Cristo, não precisamos nos prender a vestes de justiça própria quando um remédio perfeito está disponível a nós (Rm 5.8). Nossa ira/raiva desagrada aos outros, e mais ainda a Deus. Ao invés de redefinir nossa ira como algo não pecaminoso, a cruz nos dá convicção de que nosso coração pecaminoso pode ser remido e transformado. Por meio de nossas palavras, nosso coração revela o quê ou quem nós amamos (Tg 3.8-10). Para aqueles que querem dar a Deus o primeiro lugar, é importante conhecer e avaliar a si mesmos, reconhecendo a ira pecaminosa por aquilo que ela é, e por como a estão expressando.
Estratégia n° 7: Escolha seu remédio
“Beba para afogar suas mágoas” é muitas vezes o que o mundo indica para lidar com a ira que se acumulou ao longo do tempo. “A vida é breve; tenha um caso”, como se a frustração pudesse ser acalmada com o adultério. “Felicidade é um dia no shopping”.
Jesus disse: ” “Venham a mim, todos os que estão cansados e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso” (Mt 11.28). Ao invés da paz temporária encontrada em uma garrafa ou em algum outro ídolo, Deus deseja nos dar conforto e descanso. Não precisamos escapar da dor. Na cruz de Cristo, somos lembrados de que Deus é quem entende e levou sobre Si a nossa dor (Fp 3.10). Quando sofremos injustiças por amor a Ele, somos abençoados.
Estratégia n° 8: Descarregue sua ira
Ouvimos dizer: “Soque, bata ou chute um saco de pancadas. Use sua ira em atividades físicas agressivas. Canalize melhor a sua ira praticando os esportes extremos ou serrando madeiras”.
A cruz de Cristo não nos pede para minimizar a nossa dor, mas em vez disso ela nos dá esperança em meio a dor. A vida muitas vezes machuca, e podemos admitir isso. Temos um Deus que provou que se preocupa conosco, levando sobre Si a nossa penalidade maior e dolorosa (1Pe 2.24). O problema com as estratégias para descarregar e redirecionar as emoções é que a ira, muitas vezes, acaba saindo de verdade em direção a pessoas inocentes, que estão ao nosso lado, como o cônjuge ou os filhos.
Estratégia n° 9: Apazigue o conflito
O mundo diz: “Aprenda a negociar melhor e desenvolva suas estratégias de pacificação. Ao invés de enfrentar o conflito, evite-o por todos os meios possíveis”.
A cruz de Cristo é a solução completa e definitiva de Deus para a paz. O amor de Deus traz paz onde os conflitos furiosos trazem dor e confusão. A cruz nos dá a certeza de que teremos paz afinal, mas ela também nos lembra de que não deveríamos lutar a nosso modo pela paz! Deus já venceu a batalha, e pelo processo de santificação podemos desfrutar da vitória conquistada na cruz. Deus abençoa os pacificadores (Mt 5.9), mas não aqueles que promovem uma falsa paz.
Estratégia n° 10: Não se importe
O mundo diz: “Desenvolva uma pele grossa e se recuse a levar em conta as ofensas. As decepções da vida doem menos dessa maneira!”.
Não precisamos fingir que os desapontamentos da vida não nos atingem. Os Salmos estão repletos de ira, medo, desapontamentos, culpa e vergonha – todas as emoções incômodas que experimentamos (Sl 32, 73, 77, 102, entre outros). Ainda assim, os Salmos sempre nos levam de volta a um Deus amoroso, que está pronto para ajudar em momentos de dificuldade (Sl 20.7; 50.15). Sem a cruz de Cristo, a vida é irremediavelmente inútil, mas por meio da cruz, o amor de Deus nos cobre em meio aos desapontamentos da vida.
Quando proclamamos a verdade da cruz de Cristo e ajudamos nossos aconselhados a olhar para o relacionamento vertical, com Deus, nós os ajudamos a superar a ira porque o foco e a adoração de seu coração muda. Como conselheiros bíblicos, nossas estratégias podem incluir alguns aspectos bons em comum com as estratégias horizontais, mas não devemos parar por aí. Ajudar os aconselhados a ver a cruz de Cristo como a resposta para a sua ira é crucial para lidar com a ira de forma que agrade ao Senhor e para os colocar em um caminho de mudança permanente e crescimento contínuo.
Embora esse seja um breve quadro daquilo que devemos incentivar no aconselhamento, minha esperança é que aprendamos a pensar biblicamente sobre os problemas da nossa cultura e que nossas conversas apontem aos outros a cruz de Cristo.
O artigo 10 Cross-Focused Principles Versus 10 Horizontal Strategies for Dealing with Anger, por Tim Allchin, foi publicado originalmente no site da Biblical Counseling Coalition e usado com permissão.