Suzzanne Bonn
Exortamos vocês, irmãos, a que admoestem os que vivem de forma desordenada, consolem os desanimados, amparem os fracos e sejam pacientes com todos. (1Ts 5.14- NAA)
A apresentação
Por um momento, fiquei perplexa. Minha aconselhada me contou como era cansativo administrar sua rotina para estar disponível às 19h para o telefonema diário de sua filha, agora já na meia-idade. Toda noite, sua filha ainda revivia um trauma sofrido vários anos antes, algo que tem dificultado que ela se mantenha em um emprego, frequente a igreja ou faça qualquer coisa produtiva ou útil. Essa mãe amorosa e solícita desejava fazer o certo por sua filha, mas estava preocupada com a falta de progresso que a filha mostrava. Chegou o momento em que minha aconselhada me fez uma excelente pergunta.
A pergunta
“Você acha que eu a estou realmente ajudando ou apenas sendo condescendente?”
Naquele momento, ela se colocou em uma posição de vulnerabilidade. Dependendo do conselho que eu lhe desse, ela poderia ser desafiada a mudar um curso de ação que vinha de longa data, que havia se tornado familiar e cômodo para ambas. Para mim, foi um daqueles momentos em que o Senhor me deu uma boa dose de sabedoria para aplicar uma de minhas partes favoritas das Escrituras, que é usada com frequência pelos conselheiros bíblicos.
1Tessalonicenses 5.14 nos leva a três diferentes aplicações para três diferentes condições. Cada uma delas é uma ação específica a ser aplicada a um tipo específico de pessoa. Precisamos entender todos esses termos com precisão para aplicar a prescrição bíblica correta. O texto nos diz para
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- admoestar(repreender, advertir, reprovar) um cristão que vive de forma desordenada(alguém que é indisciplinado, rebelde, intratável, que anda fora da linha)
- consolar (confortar, animar, incentivar) um cristão que está desanimado(desencorajado, desesperado, consternado)
- amparar(apoiar, ajudar, sustentar) um irmão que está fraco(vulnerável, imaturo, fragilizado).
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Cada uma dessas ações deve ser aplicada com paciência, independentemente da condição.
A motivação e a dedicação daquela mãe não poderiam ser colocadas em dúvida, mas tanto a avaliação da condição espiritual da filha quanto a aplicação da prescrição bíblica adequada podiam ser questionadas. Embora ela não tenha usado os termos específicos mencionados na passagem, ela estava agindo de acordo com sua convicção de que a filha estava frágil e desanimada, e só precisava ser ajudada e incentivada para voltar a uma vida ativa. Tenho certeza de que houve uma ponto logo após a crise em que, de fato, sua filha estava fragilizada e desanimada, necessitada de amparo.
Anos depois, porém, sua filha se mostrava cada vez mais ansiosa e agora se tornara uma pessoa amarga, manipuladora e preguiçosa. Ela mostrava todas as evidências de uma vida de comodismo e dependência de sua pensão por incapacidade. Sua saúde estava sofrendo com isso e seu mundo estava se tornando cada vez mais autocentrado e triste. Sua mãe certamente a encorajava, mas não da forma desejável. Em vez de ser direcionada pela mãe à maneira de pensar e ao estilo de vida bíblicos, essa filha usava o ouvido atento de sua mãe como uma licença para pensar continuamente sobre a crise inicial, reforçar suas respostas em desacordo com a Bíblia diante do trauma e dos danos sofridos anos atrás, e com isso a se sentir cada vez mais vitimizada.
A resposta
Rapidamente, pedi ao Senhor uma resposta biblicamente consistente e sábia para a pergunta legítima daquela mãe, e Ele respondeu fielmente. Nós nos voltamos juntas para 1Tessalonicenses 5.14, lemos o texto bíblico e avaliamos a resposta da filha ao consolo e à ajuda que continuavam a ser oferecidos pela mãe. Após anos de constante encorajamento, será que a filha mostrava-se agora revigorada e fortalecida? Não. Ela se tornara mais forte e ganhara vitalidade por meio da ajuda contínua que estava recebendo? Não, muito pelo contrário. No atual momento, então, uma admoestação, feita com amor, mansidão e paciência, era o que se fazia necessário.
Frequentemente, precisamos fazer uma reavaliação da condição do aconselhado e da aplicação que nós mesmos estamos fazendo da prescrição do Senhor para aquele caso. Essa avaliação tem por base os resultados colhidos após oferecermos cuidado e conselhos biblicamente. Um cristão desanimado será incentivado e se sentirá animado ao receber fielmente um encorajamento piedoso. Da mesma forma, um cristão fraco será fortalecido e apoiado por irmãos e irmãs na fé que o ajudem a carregar seus pesos até o momento de ele ser capaz de voltar a suportá-los. Os indisciplinados, porém, raramente desejam uma admoestação, e talvez não apreciem quando um irmão na fé sugere a necessidade de arrependimento e esforço para mudar. Muitas vezes, a reação do aconselhado ao conselho recebido pode ser substancial para a avaliação.
Os cristãos desanimados ou fracos podem estar assim por várias razões. A luta inflexível contra a tentação, a imaturidade espiritual e inexperiência, a falta de conhecimento, entendimento e sabedoria, as provações e tribulações da vida – especialmente quando várias delas nos atingem em curto intervalo de tempo – são apenas alguns exemplos. Os crentes desanimados ou fracos não estão necessariamente em pecado. No entanto, os cristãos que vivem de forma desordenada estão, sim, pecando e possivelmente indiferentes ao senso de culpa que o Senhor quer usar para levá-los de volta a Ele.
Às vezes, enquanto nossos aconselhados estão expondo os fatos que os levaram a nos procurar, é um desafio discernir em qual categoria devem ser enquadrados. Eles podem se apresentar desanimados, e nós os encorajamos; talvez se mostrem fracos, e procuramos fortalecê-los. Entretanto, se continuarem a não evidenciar mudanças apesar de nossa intervenção, é aconselhável reavaliar e considerar se deveriam ser enquadrados na categoria de pessoas que vivem de forma desordenada. Neste caso, uma repreensão amorosa se faz necessária. Uma aplicação indevida da ordem que Deus nos deu resultará em condescendência, incentivando o comportamento pecaminoso.
Princípios a serem lembrados
1- Ouvir uma admoestação talvez seja algo muito difícil para um aconselhado, mas a admoestação pode ser dada em amor, unida à esperança que provém daquilo que o Senhor é capaz de fazer na vida de um cristão. Se o aconselhado escolher substituir a indiferença pela humildade e a obediência, o arrependimento não deve tardar (Pv 27.6; 1Pe 5.6; Hb 12.1-11; Ef 4.22-24; Fp 1.6).
2- Ser “paciente com todos” não deve ser confundido com ser condescendente com o pecado. Por exemplo, quando o aconselhado simplesmente deixar de fazer a atividade atribuída pelo conselheiro para ser feita entre um encontro e outro, isso deverá resultar em uma admoestação dada com mansidão que, se não for atendida, terá como consequência a interrupção do processo de aconselhamento até que o aconselhado se disponha sinceramente a cumprir o que foi pedido (2Tm 3.5; 1Tm 5.20).
3- Embora uma verificação do entendimento do aconselhado quanto à própria salvação em Cristo seja parte do início do processo de aconselhamento, uma recusa inflexível a mudar requer que o conselheiro volte a esse assunto. É perfeitamente possível que o aconselhado suponha ser salvo porque acredita em Deus ou porque talvez tenha repetido uma oração quando criança, sem entendimento, mas que ele nunca tenha, de fato, reconhecido sua condição pecaminosa (Lc 4.18). Pode ser que o aconselhado ainda necessite se arrepender e confiar apenas em Jesus para a salvação (At 16.31).
A verificação da condição de um aconselhado requer sabedoria. Quão maravilhoso é que o Senhor nos promete que Ele nos dará abundantemente a Sua sabedoria quando nós a pedirmos com fé (Tg 1.5). Ao recebermos essa sabedoria, nossa própria fé amadurece e podemos direcionar nossos aconselhados para uma mudança santificadora.
Suzzanne Bonn é conselheira certificada pela Association of Certified Biblical Counselors (ACBC) e atualmente serve no ministério de aconselhamento bíblico da Arcade Church em Sacramento, na Califórnia.
Original: Am I helping or enabling?
Artigo publicado pela Association of Certified Biblical Counselors. Traduzido com autorização.
Tradução e adaptação: Conexão Conselho Bíblico