Por que não podemos simplesmente nos dar bem?

Jason Ho

Se vivêssemos num mundo perfeito, estaríamos todos na mesma página, todos concordaríamos em tudo e todos nós nos daríamos sempre bem! Entretanto, se os acontecimentos atuais têm alguma coisa a nos ensinar, é que a unidade pode ser instável, frágil e desafiadora. Diferenças, desentendimentos e conflitos ameaçam a união, e não há falta deles ao nosso redor. O que também fica claro é que a família da igreja, formada por pessoas chamadas a serem amorosas, centradas em Cristo e unânimes no pensar (Fp. 2.2), não está imune a conflitos. Na verdade, com o calor polarizador das diversas questões sociais e políticas atuais, talvez não tenha existido ameaça tão grande à unidade cristã quanto a que vemos agora.

Em Efésios 4, Paulo compartilhou uma implicação crucial do evangelho: a unidade no Corpo de Cristo. “Por isso eu, o prisioneiro no Senhor, peço que vocês vivam de maneira digna da vocação a que foram chamados,  com toda a humildade e mansidão, com longanimidade, suportando uns aos outros em amor,  fazendo tudo para preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz” (Ef 4.1-3). Paulo listou as atitudes do coração que devemos adotar para andar de maneira digna do evangelho. Com humildade, mansidão e paciência, devemos – e este é um imperativo – suportar uns aos outros. Suportar é sustentar, permanecer uns com os outros. Como cristãos, porém, sabemos que não basta aparentemente convivermos com essas divergências enquanto fervemos por dentro. Devemos suportar com motivação de coração e atitude corretas. É por isso que Paulo diz que devemos suportar uns aos outros em amor. Um bom resumo de suportar seria sustentar o relacionamento em amor. Sustentamos o relacionamento nas fraquezas, falhas, diferenças, preferências uns dos outros, até mesmo no pecado, com uma atitude decidida a amar os outros de forma proativa, encaminhá-los a Cristo e edificá-los.

Esse é um lembrete muito oportuno e importante em momentos nos quais, talvez pela primeira vez, amigos queridos e colegas encontram-se inexplicavelmente em lados opostos de algum debate acalorado e emocionante. Estar em extremos opostos do espectro causa tensão e distância bastante prejudiciais. As amizades se desfazem ou se tornam tensas. Alguns lutam com atitudes de julgamento, frustração, ira e até ódio. Tudo isso é agravado pelo fato de que, devido ao distanciamento social, é difícil sentar e ter uma conversa. Ficamos, então, remoendo as coisas em nossa mente. Nós lemos e interpretamos os pensamentos dos outros, e agimos como juiz e júri com base em postagens ou naquilo que ouvimos de segunda mão sobre o que outros fizeram.

Diante disso, com humildade, mansidão e paciência, vamos explorar mais a fundo como deve ser o “suportar um ao outro em amor”.

Tirem a trave cada um de seu próprio olho
Um aspecto fundamental da humildade é ter uma visão realista da nossa condição. Quais são seus preconceitos? Será que suas lutas pessoais, talvez como alguém que trabalha na área da saúde, como proprietário de uma pequena empresa, como pai ou como mãe podem afetar sua visão do que está acontecendo no mundo? A filiação a um determinado partido político ou organização pode levá-lo a reforçar a defesa de determinada posição com pouca consideração de uma visão diferente? E quanto aos ídolos do coração, será que a justiça tornou-se mais importante do que a graça, a segurança superou a fé, e estar certo tornou-se mais importante do que amar? Como você está respondendo às pessoas com as quais não concorda? Existe ira pecaminosa, irritação, frustração e impaciência, ou existe uma resposta construtiva que procura compreender, aprender com um ponto de vista oposto e até mesmo fortalecer sua amizade? Com humildade, vamos começar por avaliar se estamos contribuindo para a falta de unidade (Mt 7.5).

Deem preferência uns aos outros
Mansidão – bondade e sensibilidade na maneira de tratar os outros – reflete-se muitas vezes em como damos a preferência aos outros. Quando não concordamos, são questões de pecado ou de diferenças de opinião? Em vários dos problema atuais, não há um certo e um errado claramente definidos. Frequentemente, estabelecemos nossas margens de conforto pessoal: aqui está o comportamento que considero seguro e aqui está o comportamento que é muito arriscado. É gracioso dizer isto, mas não aquilo. Postar online desta forma é inteligente, mas daquela outra já é ir longe demais. Sabemos que, muitas vezes, essas questões não são simples, e requerem muito discernimento e sabedoria. Muitas vezes, as posturas que assumimos são apenas preferências. Estamos abertos a considerar nuances, diferenças de circunstâncias, liberdade cristã?

As Escrituras nos dizem que se não for uma questão de pecado, mas uma questão de preferência, devemos ceder lugar aos interesses dos outros (Fp 2.4; Rm 12.10). Isso significa que não temos que concordar totalmente, mas podemos reconhecer e aceitar com amor a conclusão a que um amigo chegou sobre um assunto sem uma atitude de hostilidade ou de que somos mais santos do que ele. Podemos pensar de maneira diferente e ainda interagir com mansidão.

Acreditem no melhor uns dos outros
A paciência pode consistir simplesmente em reservar um tempo para ouvir e entender o ponto de vista da outra pessoa. A declaração de apoio que alguém fez a uma causa ou problema o leva a presumir coisas negativas sobre aquela pessoa, que você não pode verificar? Você faz julgamentos precipitados das motivações, intenções ou planos dos outros? Você tem a tendência de presumir o pior ou pelo menos não o melhor dos outros? Ou você dá o benefício da dúvida? Você acha que os outros têm boas intenções e estão agindo de acordo com o que acreditam ser certo, melhor e sábio? Você presume que eles estão agindo com amor, mesmo que suas ações não estejam de acordo com o que você acredita ser o melhor? Vamos pacientemente dedicar tempo para nos entendermos (1Co 13.7).

Suportem uns com os outros em amor
Amado, vamos suportar uns aos outros em amor. Trabalhe as diferenças de maneira amorosa. Faça boas perguntas. Não ataque, mas fique ao lado. Reconheça e admita que você também já falhou de igual maneira ou até mais do que seu amigo.

Se o seu irmão ou irmã está realmente em pecado ou precisa ser mais cuidadoso ao se expressar ou emitir opiniões, não se irrite e perca toda a esperança, mas procure seu irmão para uma conversa. Deixe que o amor o conduza.

Perguntas para refletir
1- Você desfez a amizade com alguém recentemente? O que você poderia ter feito melhor para amar essa pessoa?
2- Quais aspectos do momento atual tornam a unidade dentro da igreja mais desafiadora?



Jason Ho é médico e faz parte da liderança espiritual da Lighthouse Community Church em Torrance, Califórnia. Ele ajuda nos ministérios de aconselhamento e louvor, entre outros.



Original: Why Can’t We All Just Get Along?
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition
Tradução: Carla Silva
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico
Usado com permissão.