Joshua Waulk
“Sinto-me preso e parece que não encontro Deus em lugar algum.”
“Não consigo esquecer como eles me trataram. Eu me senti como se fosse menos que humano.”
“Não há esperança para mim. Lamento ter desperdiçado seu tempo.”
“Esta é a vontade de Deus para mim. Não adianta mais orar”.
Frequentemente ouço a expressão de sentimentos como esses, emocionalmente carregados, vindo de aconselhados que estão passando por um período de depressão. Algumas vezes, fiquei persuadido de que as raízes eram, pelo menos em parte, fisiológicas. Mais frequentemente, porém, existe uma circunstância externa identificável que deu origem à mudança de humor: a perda do emprego, uma doença, a morte de um ente querido ou cônjuge, o divórcio, e assim por diante.
Em muitos casos, aconselho que eles façam um check-up médico e sigam as ordens médicas para cuidar de seu corpo, enquanto prossigo com o aconselhamento bíblico dirigido ao coração. Em todos os casos, asseguro-me de que os aconselhado se comprometam a não esconder qualquer pensamento que possa ser entendido como “suicida”, mas trazer à luz aqueles pensamentos que geralmente preferem permanecer ocultos (cf. Ef 5.13).
Essas e outras questões básicas iniciais não se mostram, geralmente, como as mais difíceis de resolver. Felizmente, os problemas médicos e os pensamentos suicidas não são comuns. O que tem sido mais comum e difícil de superar para os aconselhados é o diálogo contínuo que acontece no interior de seu coração. Sobre este ponto, Paul Tripp escreveu: “Ninguém é mais influente em sua vida do que você, porque ninguém fala mais com você do que você mesmo”.[1]
A depressão, ao que parece, toma a forma de um pregador desenfreado de um falso “evangelho” que rouba a esperança dos aconselhados à medida que domina progressivamente seus pensamentos e tem potencial para influenciar seu comportamento. Embutida nesse padrão prejudicial está uma visão distorcida de quem é Deus e uma dúvida persistente sobre o quanto Suas promessas são confiáveis. Em casos assim, a chave para o processo de mudança é ajudar o aconselhado a aprender como pode dominar essa “voz interior” e saturar sua depressão com as verdades das Escrituras.
Embora tenhamos o cuidado de não minimizar a realidade do sofrimento de um aconselhado, devemos lembrar que a depressão, bem como a ansiedade, muitas vezes superestima o peso do problema, enquanto subestima a abundância de esperança disponível em Cristo. Mergulhados na depressão, os aconselhados podem cair nesse padrão de pensamento em que cada nova frustração serve apenas para reforçar a visão contrária à Bíblia. Edward Welch escreveu: “A depressão pode acumular muitas interpretações imprecisas sobre nós mesmos, outras pessoas e o próprio Deus”. [2] As Escrituras vão corrigir essas interpretações erradas e crenças falsas. O conselheiro bíblico deve ser um especialista em ajudar os aconselhados a substituir as mentiras da depressão pelas verdades das Escrituras.
Levando cada pensamento cativo
O apóstolo Paulo escreveu que, como cristãos, “levamos cativo todo pensamento à obediência de Cristo” (2Co 10.5). Por mais compreensível que os pensamentos depressivos e a tristeza de um aconselhado possam ser em determinadas circunstâncias, a natureza da mensagem da depressão é muitas vezes contrária ao evangelho.
Se compararmos a depressão a um pregador de um falso evangelho, a pessoa deprimida é como uma congregação que se reúne regularmente para ouvir sua voz e receber sua instrução. Com o tempo, as raízes da depressão penetram nos recantos mais profundos do coração. Isso tanto nos ajuda a entender por que tantas vezes ela aflige pessoas fisicamente saudáveis, quanto nos dá pistas sobre como podemos ajudar melhor o aconselhado deprimido.
Embora todos nós possamos nos beneficiar de uma palavra encorajadora de tempos em tempos, aqueles que lutam contra a depressão profunda precisam de algo mais do que chavões religiosos, clichês ou o muito comum “Vou orar por você!”. Os paisagistas não removem com colheres de plástico uma palmeiras totalmente desenvolvida. Da mesma forma, os conselheiros bíblicos não atacam os problemas espirituais com metodologias e técnicas frágeis, que negam a verdade de Cristo. Em vez disso, eles equipam os aconselhados com as armas espirituais que Paulo descreveu como “poderosas em Deus, para destruir fortalezas” (2Co 10.4).
Lutamos pela mudança
Edward Welch nos lembra que a luta contra a depressão impulsionada pelo evangelho é simplesmente isso: uma guerra! Ele diz que essas mudanças vêm apenas por meio de uma guerra, e a questão-chave para vencer é humilhamo-nos diante do Senhor e crermos no que Ele diz.[3]
Crer é uma questão crucial. Não se trata de uma crença vaga, mas da confiança na Palavra de Deus em meio às circunstâncias difíceis. Nossos aconselhados continuarão a confiar nas mentiras ou meias verdades da depressão ou confiarão nas promessas de Deus? Muitas vezes é útil compreender como e por que eles chegaram às suas conclusões mentirosas para poder, então, conduzi-los em uma conversa que dá esperança bíblica.
Quando trabalhamos com aconselhados que estão escolhendo acreditar no falso evangelho da depressão, uma estratégia que pode ser útil é pedir que façam uma lista das afirmações negativas que ouvem pregadas por sua “voz interior”, ou seja, a voz da sua depressão. Sozinhos, ou durante o encontro de aconselhamento, encoraje-os a procurar as principais referências bíblicas que falam a verdade em resposta às afirmações da depressão.
Finalmente, conduza os aconselhados em uma conversa que examine as afirmações, compare e estabeleça o contraste entre a mentira e a verdade. O objetivo é levar a uma aplicação prática das afirmações bíblicas e à esperança renovada no verdadeiro evangelho de Jesus Cristo.
De fato, pregar o evangelho a nós mesmos é algo poderoso na luta contra a depressão. As emoções perturbadas não são silenciosas. Eles estão sempre pregando ao coração e exigindo ser ouvidas. Como conselheiros bíblicos, devemos ensinar nossos aconselhados deprimidos a não permitir que seu inimigo tenha a última palavra.
[1] Paul Tripp. “You Talk to Yourself”. Paul Tripp Ministries. Acesso em 30 de julho 2022. http://www.paultripp.com/wednesdays-word/posts/you-talk-to-yourself.
[2] WELCH, Edward. Depressão: a tenebrosa noite da alma. São Paulo: Cultura Cristã, 2012.
[3] Ibid.
Joshua Waulk é fundador é director executivo de Baylight Counseling em Clearwater, Florida. Completou seus estudos em aconselhamento bíblico no Southeastern Baptist Theological Seminary e é membro da Association of Certified of Biblical Counselors (ACBC).
Original: Taking Every Thought Captive
Artigo publicado pela Biblical Counseling Coalition. Traduzido com autorização.
Tradução: Carla Silva
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico