Libertando-se da armadilha do desempenho

Shannon Kay MacCoy

Já aconteceu de você querer tanto que Deus lhe desse algo que você fez um rápido inventário espiritual e, secretamente, começou a “melhorar” nas áreas onde você achou que não estava muito bem como, por exemplo, orar mais, dar mais ofertas, estudar mais sua Bíblia, dar seu nome para “servir” na sua igreja ou ir à igreja “todos” os domingos?

Existe em nós uma tendência de acreditar que aquilo que fazemos ou deixamos de fazer determina se obtemos ou não aquilo que queremos. Infelizmente, esta mentalidade nos acompanha no nosso relacionamento com Cristo. É algo contra que devemos lutar diariamente.

Não estou falando sobre uma mentalidade de “salvação pelas obras”. A maioria de nós acredita que recebemos a salvação pela graça, por meio da fé, como dom de Deus (Ef 2.8, 9). Em seguida,  porém, começa a batalha entre viver pela lei ou viver pela graça.

Sabemos que existem benefícios para nós em fazer o que é certo e existem prejuízos quando fazemos o mal. Isso geralmente é verdade à medida que nos movemos pelas muitas facetas da vida:

— Se você estudar muito, você tirará boas notas. Se você não estudar, você será reprovado.
— Se você cumprir seus deveres no trabalho, você será pago. Se não, você será despedido.
— Se você for um bom amigo, você terá amigos. Se não, você perderá os amigos.

O sistema deste mundo, porém, reforça que nossas obras, boas ou más, é que determinam nossa vida de maneira positiva ou negativa. Deus fica fora do quadro.

Uma mentalidade baseada em desempenho
A mentalidade baseada em desempenho é uma forma básica de legalismo no cristianismo. Acreditamos que a maneira de Deus nos tratar está baseada em quão elevado é nosso desempenho. Quando temos um bom desempenho, esperamos estar em boa situação perante Deus e receber Suas bênçãos. Quando temos um mau desempenho, esperamos estar na lista de desobedientes e receber Seu castigo.

Há cinco ídolos principais no nosso coração que nos impulsionam na busca de proveitos egoístas: justiça própria, autojustificação, autoconfiança, autopiedade e autoestima.

Os ídolos do coração na mentalidade baseada em desempenho

Justiça própria

— Motivação: Ganhar a aprovação de Deus pelas minhas boas obras.
— Mentira: Minhas boas obras são boas o suficiente para Deus me amar e me abençoar.
— Verdade: Ninguém é justo e devemos nos submeter à justiça de Deus (Rm 3.10; 10. 3).

Autojustificação

— Motivação: Ganhar a paz de Deus, desculpando meu coração e ações pecaminosas.
— Mentira: Eu tenho uma boa desculpa para minhas ações e, portanto, Deus verá essa situações como eu a estou vendo.
— Verdade: Eu tenho paz com Deus por meio da justificação pela fé (Rm 5.1).

Autoconfiança

— Motivação: Ganhar o amor de Deus esforçando-me mais.
— Mentira: Se eu me esforçar mais e trabalhar mais, Deus irá me amar.
— Verdade: O amor de Deus é incondicional e Sua graça é suficiente (Rm 5.6-8; 2Co 12.9).

Autopiedade

— Motivação: Mostrar meu desagrado com Deus por como Ele me trata.
— Mentira: Se eu sentir pena de mim mesmo, Deus verá meu sofrimento e fará com as coisas melhorem.
— Verdade: Minha vida não é minha. Deus agirá de acordo com a vontade dEle (Gl 2.20).

Autoestima

— Motivação: Ganhar a aceitação de Deus construindo meu mérito e valor.
— Mentira: Se eu me sentir bem comigo mesmo, Deus fará o mesmo a meu respeito.
— Verdade: Não há nada naturalmente bom em mim.  Meu valor está em Cristo (Sl 16.2; Lc 12.7; Rm 5.8).

O círculo perigoso da armadilha do desempenho
Ficamos presos na armadilha do desempenho sem perceber. Nosso coração quer amor, aceitação, aprovação, reconhecimento, alegria, paz e conforto. Iniciamos cada dia impulsionados por ter um bom desempenho nos papéis que nos darão os maiores aplausos. Continuamos a reavaliar e reajustar nossos esforços se não estivermos colhendo as recompensas.

Esse círculo vicioso de autoengano pesa muito sobre nós. Medo, ansiedade, depressão e desespero invadem nosso coração. Deus parece-nos frio, distante e inacessível. Nós nos vemos presos na mais profunda podridão do pecado, em comportamentos destrutivos e hábitos dominadores relacionados a comida e drogas, pornografia, gastos excessivos, trabalho, e outros mais. A Bíblia nos adverte sobre esse ciclo em Tiago 1.14-16: “Cada um, porém, é tentado pelo próprio mau desejo, sendo por este arrastado e seduzido.  Então esse desejo, tendo concebido, dá à luz o pecado, e o pecado, após ser consumado, gera a morte. Meus amados irmãos, não se deixem enganar”.

Quando a vida vai terrivelmente mal, fazemos uma busca em nossos arquivos empoeirados de pecados cometidos. Eu adulterei. Eu pratiquei um aborto. Eu roubei dinheiro. Eu trapaceei nos meus impostos. Eu menti para meu chefe. Eu engravidei fora do casamento. Eu me casei com um rapaz descrente. E a lista prossegue. O que devo fazer para remediar? Nós nos enganamos, pensando que podemos manipular a Deus com uma simples melhora do nosso desempenho.

O autoengano diz:

— Deus está me castigando.
— Deus não me ama.
— Deus pode ser bom para você, mas ele não é bom para comigo.

O autoengano pergunta:

— O que eu estou fazendo de errado?
— Por que Deus está me castigando?
— O que eu devo fazer para ficar de bem com Deus?

Libertar-se da armadilha do desempenho
Libertar-se da escravidão da armadilha do desempenho requer três elementos cruciais: crer em Deus, aceitar Sua graça e obedecer a Deus.

1- Crer em Deus
Aqueles cuja maneira de pensar está baseada no desempenho devem crer em Deus de acordo com Sua palavra quando ela diz: “Sem fé é impossível agradar a Deus” (Hb 11.6). A tarefa que devemos “cumprir” em primeiro lugar é crer em Jesus Cristo (Jo 6.29), em Sua morte em nosso favor e ressurreição. Crer em Jesus significa crer que:

— Deus nos amou embora fôssemos pecadores (Jo 3.16).
— Deus nos justifica em Cristo (Rm 3.24).
— Deus nos aceita em Cristo (Rm 8.31-34).
— Deus nos dá a Sua paz em Cristo (Fp 4.7).

 2- Aceitar a graça de Deus
Nós recebemos a graça de Deus pela fé em Jesus Cristo. Em 1Coríntios 15.10, Paulo proclama que é a graça de Deus que o capacita a trabalhar arduamente no serviço a Deus. Assim como aconteceu com Paulo, a graça de Deus transforma nossa vida, antes caracterizada pelo desempenho autocentrado, em uma vida caracterizada por atos de obediência centrados em Deus.

 3- Obedecer a Deus
A obediência sem fé é justiça própria. Obedecer aos mandamentos de Deus porque não queremos ser castigados, queremos ter certeza do amor de Deus ou queremos justificar nossas ações é um ato centrado em nós mesmos. Deus deseja obediência por meio da fé em Cristo, que é uma evidência do nosso relacionamento amoroso com Ele (Jo 14.23). Em lugar de ter um bom desempenho para ganhar o favor de Deus, nós respondemos a Ele com obediência porque Deus já nos estendeu o Seu favor.

Perguntas para reflexão
De que maneira você percebe que a sua vida está presa na armadilha do desempenho?
Se você não consegue identificar nenhuma área, pergunte a pessoas que o conhecem bem.  Elas podem lhe dar algumas dicas.
Como os três elementos para se libertar da armadilha do desempenho se aplicam à sua caminhada com Jesus?



Shannon Kay McCoy atua como conselheira bíblica em Valley Center Community Church, no sul da Califórnia. Ela completou o mestrado em aconselhamento bíblico em em The Master’s University em Santa Clarita, Califórnia, e é certificada pela ACBC. É autora do Help! I’m A Slave To Food e contribuiu no livro Mulheres Aconselhando Mulheres.


Original: Breaking Free from the Performance Trap
Artigo publicado por Biblical Counseling Coalition
Tradução: Carla Silva
Revisão e adaptação: Conexão Conselho Bíblico